As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.
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terça-feira, 8 de maio de 2012

Vida Maria (Animação)

Vida Maria é um curta-metragem em animação 3D que tem como personagem principal Maria José, com seus sonhos interrompidos ainda criança, quando precisou abrir mão de suas descobertas, das letras e dos estudos, para se dedicar ao trabalho. Ela cresce, conhece Antônio, se casa e tem filhos, entre eles, Maria de Lourdes. Mais um ciclo se repete, pois Maria José age com Lourdes exatamente como sua mãe agiu, reproduzindo o seu passado no futuro da filha.


Direção: Márcio Ramos Evangelista
(2006 - Brasil)

"O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele."
(Immanuel Kant)

segunda-feira, 23 de abril de 2012

LENDA: Cobra-Norato

Cobra-Norato é uma lenda popular na Amazônia. 
SUGESTÃO DE LEITURA
Esta lenda produziu uma obra-prima da Literatura Brasileira Modernista, Cobra Norato, de Raul Bopp. Poema de descrição mitológica da Amazônia, publicado em 1931. 

"...Quero contar-te uma história:
Vamos passear naquelas ilhas decotadas?
Faz de conta que há luar.
A noite chega mansinho.
Estrelas conversam em voz baixa.
O mato já se vestiu.
Brinco então de amarrar uma fita no pescoço
e estrangulo a cobra.
Agora, sim,
me enfio nessa pele de seda elástica
e saio a correr mundo..."

O texto a seguir é de Theobaldo Miranda Santos
no livro "Lendas e Mitos do Brasil"
A obra está disponível para consultas na Biblioteca SEMA em Macapá

LENDA DA COBRA-NORATO

Uma índia que vivia entre os rios Amazonas e Trombetas teve dois filhos gêmeos. Quando os viu, quase morreu de susto. Não tinham forma humana. Eram duas serpentes escuras. Assim mesmo, a índia batizou-as com os nomes de Honorato e Maria. E atirou-as no rio, porque elas não podiam viver na terra.
As duas serpentes criaram-se livremente nas águas dos rios e igarapés. O povo chamava-as de Cobra-Norato e Maria Caninana. Cobra-Norato era forte e bom. Nunca fazia mal a ninguém. Pelo contrário, não deixava que as pessoas morressem afogadas, salvava os barcos de naufrágios e matava os peixes grandes e ferozes.
De vez em quando, Cobra-Norato ia visitar sua mãe tapuia. Quando caía a noite e as estrelas brilhavam no céu, ele saía d'água arrastando seu corpo enorme. Deixava o couro da serpente à beira do rio e transformava-se num rapaz bonito e desempenado. Pela madrugada, ao cantar do galo, regressava ao rio, metia-se dentro da pele da serpente e voltava a ser Cobra-Norato.
SUGESTÃO DE LEITURA
Maria Caninana era geniosa e malvada. Atacava os pescadores, afundava os barcos, afogava as pessoas que caíam no rio. Nunca visitou sua velha mãe. Em òbidos, no Pará, havia uma serpente encantada, dormindo, dentro da terra, debaixo da igreja. Maria Caninana mordeu a serpente. Ela não acordou, mas se mexeu, fazendo a terra rachar desde o mercado até a igreja.
Por causa dessas maldades, Cobra-Norato foi obrigado a matar Maria Caninana. E ficou sozinho, nadando nos rios e igarapés. Quando havia festa nos povoados ribeirinhos, Cobra-Norato deixava a pele de serpente e ia dançar com as moças e conversar com os rapazes. E todos ficavam contentes.
Cobra-Norato sempre pedia aos conhecidos que o desencantassem. Bastava, para isso, bater com ferro virgem na cabeça da serpente e deitar três gotas de leite de mulher na sua boca. Muitos amigos de Cobra-Norato tentaram fazer isso. Mas, quando viam a serpente, escura e enorme, fugiam apavorados.
Um dia, Cobra-Norato fez amizade com um soldado de Cametá. Era um cabra rijo e destemido. Cobra-Norato pediu ao rapaz que o desencantasse. O soldado não teve medo. Arranjou um machado que não cortara pau e um vidrinho com leite de mulher. Quando encontrou a cobra dormindo, meteu o machado na cabeça da bicha e atirou três gotas de leite entre seus dentes enormes e aguçados.
A serpente estremeceu e caiu morta. Dela saiu Cobra-Norato, desencantado para sempre.

Se você se interessa por estes assuntos pode gostar também de (sugestões):
 
Lenda da Cobra Norato (Stella Leonardos) - Editora Villa Rica
 Livrinho de 16 páginas, indicado ao público infanto-juvenil
"Encantarias: A Lenda da Noite" - Quadrinhos com a arte do desenhista paraense Otoniel Oliveira (em 54 páginas, faz um passeio por  mitos da Amazônia. Entre eles, algumas páginas mostrando Norato e Caninana) 

 
Divagações:
Percy Harrison Fawcett foi um famoso explorador inglês que, no início do século passado, fez algumas expedições pelos interiores de um Brasil desconhecido e muito selvagem ainda (também em outros países americanos). Em seus relatos, o encontro com sucuris de até 20 metros (ou mais), capazes de tirar um homem para fora de uma canoa (descrição literal em registros). Foi o inspirador, a seu amigo e escritor Conan Doyle, da célebre obra O Mundo Perdido (1912). E, olha só, este explorador se tornou uma lenda também, pois sumiu em uma expedição na Serra do Roncador.

... Assim, percebemos uma das origens de tantas lendas amazônidas:
“A amazônia selvagem sempre teve o dom de impressionar a civilização distante”.
Euclides da Cunha (À margem da história)


Referências sobre esta lenda em:
portalsaofrancisco.com.br 
bethccruz.blogspot.com
colencionadora-de-historias.blogspot.com.br 

terça-feira, 20 de março de 2012

LENDAS DO AMAPÁ - A Cobra Sofia

Hoje é o "Dia Internacional do Contador de Histórias", data para homenagear todos que se dedicam à arte de levar fantasia e mistérios em forma de palavras e narrativas. Estas, muitas vezes, despertam o gosto ou curiosidade pela leitura e estão entre os primeiros textos conhecidos pela classe estudantil. A data foi criada na Suécia (1991) e recebeu a adesão de outros países (hoje são 25 segundo informações da web), que desenvolvem atividades culturais neste dia  e, em comum, a proposta de abordagem a um mesmo tema. Exemplo: 2004 (pássaros), 2005 (pontes), 2008 (sonhos), 2011 (água) e 2012 (árvores).
Homenagem à personagem "Dona Benta", uma das maiores contadoras de histórias na Literatura Brasileira e nos livros encantados de Monteiro Lobato. Aqui está representada por sua maior intérprete (Zilka Salaberry) na antológica série "Sítio do Pica-Pau-Amarelo".
Homenagem à meus avós maternos Apolinário e Ana Castelo (Branco Velho e Nikita), grandes contadores de histórias que me instigaram, com suas marcantes narrativas, a querer e procurar muito mais nos livros. (Foto de 1998). 

Como leitor tenho uma afeição por um segmento em especial, as lendas. São narrativas que me despertaram o apego pela leitura e transportam-me a uma terra nostálgica, onde imperam as lembranças de meus avós, o saudosimo de outros tempos e me desconectam deste mundo cheio de bites e modernidades onde o livro, para a grande maioria, já não é uma boa fonte de informação e entretenimento.
Não sou um grande contador de histórias, mas aprecio a leitura de vários. Entre eles, aqui nas terras do Amapá e neste segmento lendas, temos um escritor que tem feito um resgate de muitas estórias em suas publicações. Coisas destinadas ao esquecimento, sem um devido registro. 
Foto: joselidias.blogspot.com.br
Joseli Dias é escritor, contista, jornalista e poeta amapaense. As narrativas das lendas e dos “causos” desta região registradas por este autor, estão reunidas no livro "Mitos e Lendas do Amapá" que, atualmente, se constitue em um trabalho de suma importância para todos que valorizam os elementos mais puros e autênticos da cultura popular. É uma obra valiosa, está na 3ª edição e  representa uma importante fonte de pesquisas sobre a mitologia amapaense.
 LEITURA RECOMENDADA

Em homenagem ao escritor, à meus avós, a todos os contadores de histórias, aos cabeças nas nuvens (como eu), à amiga escritora maranhense (Camila Miranda), à prima recém-encontrada (Ana Caroline) e ao "Dia Internacional do Contador de Histórias", aí está a "Lenda da Cobra Sofia": 

Há muito tempo, em uma aldeia próxima à ilha de Santana, é que vivia Icorã, uma índia de olhos cor de mel e muito linda. A beleza da índia, incomparável entre todas as mulheres da tribo, transformava em suplício sua felicidade. É que pela formosura Icorã era cortejada pelos bravos, ao mesmo tempo em que estava destinada ao deus Tupã quando estivesse em idade apropriada. Prisioneira de sua beleza, a indiazinha vivia muito triste, raras vezes deixando a oca. Quando o fazia era para dirigir-se à beira de um grande lago, à noite, para contar à lua de seu sofrimento.
Certa noite, enquanto banhava-se ao luar, Icorã foi avistada pelo boto Tucuxi, que perdeu-se de amores por ela. Transformando-se em um cisne, Tucuxi aproximou-se da indizinha, possuindo-a através de um encantamento. Meses depois Icorã sentiu a prenhez em suas entranhas e só então descobriu que aquele cisne lindo com quem brincara no lago era na verdade um boto.
Mortificada de remorsos, Icorã embrenhou-se nas matas, permanecendo longe de tudo e de todos para ter a criança. Quando as dores vieram e a indiazinha teve seu rebento, deu-lhe o nome de Sofia e atirou a criança no lago, na esperança de que ela se afogasse e ninguém tomasse conhecimento de seu pecado. Depois retornou à aldeia, como se nada tivesse acontecido. O boto Tucuxi, arrependido do que fez, transformou a criança em uma cobra d’água, evitando assim a sua morte.
Muito tempo passou e certo dia, quando Icorã encontrava-se à beira do grande lago, sentiu as águas se revolverem e viu quando uma cobra imensa, de estranhos olhos cor de mel, deixou seu refúgio. Era a cobra Sofia, que procurava águas mais profundas para acomodar-se. Os sulcos deixados durante o trajeto, dizem as lendas, formaram o Rio Matapi.
Sofia, acreditam os mais antigos, parou para descansar onde hoje fica localizado o porto de Santana. Há alguns anos, uma grande parte da plataforma desabou. Dizem que foi a cobra Sofia que moveu-se durante o sono.

 Joseli Dias – Do livro "Mitos e Lendas do Amapá" – 3ª Edição)

Cobra Sofia
Ilustração: Honorato Júnior

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

LENDAS DO AMAPÁ - O homem que virava cavalo

Desenho de Rogério Castelo (1988)
Há muito tempo atrás falavam de um homem descendente de negro, que morava no bairro do Laguinho e depois passou a morar no bairro do Beirol, que se tornou famoso pelos seus feitos. 
Dona Maria, uma das moradoras mais antigas do bairro do Beirol, contou que tinha costume de acordar bem cedo para varrer a frente de sua casa, todas as manhãs. Um belo dia viu um cavalo preto próximo a um poste de madeira, era um pouco cerrado e o cavalo a olhava de forma estranha; o medo foi tão grande que logo entrou e chamou seu marido. Em questão de segundos, quando retornou, o cavalo já havia sumido.
Era costume os jovens saírem à noite para irem à festa. Certo dia o casal Raimunda e José, ao retornarem por volta de meia-noite, tiveram  um enconntro com o tal cavalo. Raimunda disse a José que estava com arrepio no corpo e este perguntou:
- Estais com medo!? 
Estava meio escuro, quando de repente viram um vulto. Parecia que alguém estava se aproximando... e continuaram a andar.  Quando chegaram próximo a um poste de madeira, havia um grande cavalo preto. Já vinham atravessando a rua quando o cavalo saiu correndo atrás dos dois, que saíram desesperados correndo, gritando bem alto e pedindo socorro. Dona Maria e o marido levantaram-se com o barulho. A moça e o rapaz queriam entrar no portão, mas não conseguiam abrir.
Dona Maria abriu o portão para o casal, que estava tão nervoso quee não conseguia falar nada. Passado um pouco o medo, eles falaram que foram acuados por um grande cavalo preto e Dona Maria confirmou que fora esse mesmo cavalo que teria visto no dia anterior pela manhã e que de repente havia sumido. O medo aumentou ainda mais, que acabaram dormindo na casa de Dona Maria.
Leitura recomendada
No outro dia só se ouvia comentários do grande cavalo preto, que segundo as pessoas era um homem que se transformava, pois ele lia o livro de São Cipriano e todas as pessoas que passavam ali pela madrugada falavam que o cavalo corria atrás e, o íncrível, é que ele sumia rápido sem deixar nenhum rasto. Diziam também que tentavam matá-lo, mas não conseguiam, parecia até que ele estava ouvindo, pois, quando tentavam pegá-lo ele não aparecia. As pessoas passavam a não sair mais sozinhas à noite, pois tinham medo do cavalo aparecer e correr atrás delas. Ver um bicho alvoroçado daqueles querendo nos pegar! Deus me livre! E foi assim que ficou conhecida a história do homem que se transformava em cavalo.

"Texto de Paulo Dias Morais, no livro "Amapá: Lendas Regionais".

Estas histórias surgiram em uma Macapá de outras épocas. Tempos bucólicos, quando era comum ver carroceiros, cavalos e bois transitando pela cidade. Isso perdurou até meados dos anos 8o. Cheguei até pedir carona em carroça que ia para as bandas da minha escola (Castelo Branco, no Bairro do Trem) e evitava a todo custo o encontro com os bois (uma vez até faltei na aula, pois um monte estava no caminho que costumava seguir... É!!! Mas não me chame de medroso... É que não era acostumado em lidar com esses bichos). Diziam sempre que eram de um tal Muca. Não me estranham estórias como a desta lenda. Conheço uma mulher que teve um bizarro encontro em que - certa vez quando despertou de madrugada e ouviu algo na área do quintal - ao abrir uma fresta da janela, topou com aquela carona chifruda e de olho amarelo esbugalhado lhe olhando de perto! Vá de retro!!! Seria o tinhoso?? Como dizem por aí: o amornado??? A mulher ficou petrificada, quase com ataque cardíaco. Só depois de um tempo viu que era uma parruda vaca preta. Há! Há! Há! Mas o susto ficou marcado. Ah! Essa mulher é aquela a quem tomo benção todo dia e Deus me deu como abençoada mãe... e as vacas tinham entrado no quintal sorrateiramente. Se não estiver enganado, foi em 1983.
O livro, para quem curte, faz uma abordagem bem legal sobre o folclore amapaense. Tratando de lendas, comidas típicas, festejos e medicina popular. Mas tudo de uma forma bem simplificada, é claro. Esta obra pode ser adquirida nas livrarias e bancas de revistas em Macapá.
Dá uma conferida!

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

LENDAS - Narrativas de Walcyr Monteiro


Foto: keziahraiol.blogspot.com
Walcyr Monteiro (escritor, jornalista e pesquisador paraense) ao longo de mais de três décadas vem registrando e formando um rico acervo das muitas narrativas que permeiam o imaginário amazônico. Histórias como as que ouvimos de nossos avós,  que encantam pela simplicidade de descrição e têm suas origens na falta ou busca de explicação do cotidiano. Causos, lendas urbanas, narrativas indígenas, histórias fantásticas, encontros com "visagens", experiências descritas com as mais ferrenhas convicções (ou cara-de-pau para muitos), enfim, um universo mitológico que tem sido objeto de estudo da antropologia e  sociologia,  e que certamente constitui-se em uma das mais interessantes faces da cultura popular.
A obra é vasta, com livros que já foram utilizados em montagens teatrais e roteiros cinematográficos.

“Visagem” (2006), de Roger Elarrat, baseado na obra de Walcyr Monteiro.
O filme é uma adaptação de sete contos do livro “Visagens e Assombrações de Belém”, escrito a partir de causos e lendas sobrenaturais da cidade.
É o primeiro curta de animação em stop-motion de Belém do Pará. (Texto do nabissapictures.blogspot.com)


A seguir duas lendas descritas por Walcyr Monteiro: 
"Lenda da Vitória-régia", narrativa indígena amplamente difundida e descrita por diversos autores. A versão deste texto foi publicada na revista Amazon View - Edição 43 / 2002.
"Fantasma erótico da Soledade" é uma lenda urbana de Belém do Pará, descrita no livro Visagens e Assombrações de Belém (Walcyr Monteiro - Smith Editora) - clássico da literatura fantástica amazônica, onde o autor trata de uma série de casos pesquisados , desde os anos 70,  e mostra um pouco do histórico da cidade, orações populares, alguns recortes de jornais e fotos. De fato, um livro documental sobre lendas urbanas conhecidas em Belém.
Relato-as por também serem parecidas ao que muitos acreditam, gostam de acreditar ou conhecer, nestas bandas de cá - no Amapá.

A Lenda da Vitória-régia
A exuberante paisagem que cerca a Amazônia sempre exerceu uma imensa influência na formação do imaginário caboclo. Tradições herdadas dos povos primitivos que eram a forma lógica de compreensão e explicação do princípio das coisas.
As plantas, os animais e até mesmo os seres inanimados possuíam a flama etérea da vida, cultivada pelas crenças de nossos aborígines. Tudo tinha uma razão de ser, nada estava ao léu. Os astros celestes, em especial, também eram endeusados pelos índios. Todos na tribo, por exemplo, conheciam Jaci, a Lua. Ela era a mais bela no céu e objeto de maior desejo na Terra. Os índios acreditavam que a Lua, além de cuidar das plantações e de todos os vegetais, também podia dar o amor e a felicidade eterna. 
Foto: Jonhny Sena
Certo dia, uma bela índia chamada Naiá, encantada com todas essas histórias, sonhava que a Lua escolhia as moças mais bonitas das tribos para transforma-Ias em estrelas que brilhariam para sempre no céu ou que seriam como o astro lunar.
A índia Naiá, tal qual as demais cunhãs, também desejava ser escolhida pela Lua e se tomar uma estrela no céu. Todas as noites, Naiá saía de sua maloca a fim de ser vista pela Lua, mas - para sua tristeza - ela não a chamava para junto de si.
A cunhã já não dormia mais, passava as noites andando nas cercanias da taba, tentando despertar a atenção do satélite terrestre. E nada...
Uma noite, porém, cansada de esperar, resolveu chegar até a Lua, o que fez durante dias e noites, com a maior obsessão. Passou então a correr atrás de Jaci, subindo os montes mais altos, percorrendo as planícies mais extensas, buscando as árvores mais esbeltas no afã de tocá-la. Tudo em vão.
    Foto: Jonhny Sena
Desolada, aproximou-se de um lago para chorar. Chegando lá, a índia viu a figura da Lua refletida em suas águas límpidas, acreditando que Jaci tinha ficado com pena dela e descido do céu para buscá-la. Venda a Lua tão perto, a índia não resistiu, jogou-se na água para tocá-la. Mas o reflexo se desfez e a pobre moça morreu afogada.
Jaci, comovida diante do sacrifício da bela jovem, resolveu transformá-la em uma estrela diferente daquelas que brilham no céu, uma majestosa planta chamada Vitória- régia, que passou a ser uma "lua nas águas" ou a "estrela das águas", como preferem alguns ribeirinhos.
Curiosamente, as flores dessa planta só se abrem durante a noite. Tem uma flor de perfume ativo e suas pétalas, ao desabrocharem, são brancas, tornando-se rosadas quando os primeiros raios do Sol aparecem. 
Foto: Rogério Castelo / 2008
Na descrição do escritor Walcyr Monteiro, a Vitória- régia (Euryle amazonica) é das mais bonitas plantas aquáticas do mundo. Possui folha com formato de bandeja que chega ate a I,80m de diâmetro, de coloração verde na parte virada para cima e interna, e purpúrea na sua borda externa e parte inferior. A Vitória- régia vive em lagos, lagoas e rios de águas tranquilas. Sua folha é bastante resistente e pode aguentar um peso de até 45 quilos.
Segundo o escritor paraense, a planta aquática, com toda a sua beleza e exuberância, chama a atenção de quantos a vêem, que ficam verdadeiramente extasiados, tal como aconteceu com o botânico inglês Lindlev que, ao contemplá-la, resolveu homenagear a rainha Vitória, da Inglaterra, e deu à planta o nome da soberana inglesa. Mas, conforme relata Anísio Melo, nossos índios também não ficaram indiferentes a sua beleza e contam esta linda história para justificar-lhe a origem.
Texto publicado na Revista Amazon View - Edição 43 / 2002 (pag. 36-37)
 
FANTASMA ERÓTICO DA SOLEDADE

Ilustração: Márcio Pinho
     Parou o carro na Avenida Serzedelo Corrêa, em frente à Escola Kennedy. Saltou para entregar uma encomenda. Ao retornar, consultou o relógio: 17:30 horas. Pensou - resta meia hora para encerrar o expediente. Se não desenvolver muita velocidade, vai ver que chegarei exatamente em cima da hora de bater o ponto. Quando ia entrar no carro - um velho jeep da repartição - notou um "psssssssssiu". Olhou ao redor e nada. Novamente:
     - Psssssssssiu!
     Voltou a olhar. Reparou que o chamado vinha do outro lado da rua, mais precisamente da porta do Cemitério da Soledade. Ali, bem em frente à porta, estava uma mulher aparentando seus 30 e poucos anos. Quando seus olhos se encontraram, olhou para um lado e para o outro e para trás de si mesmo, pensando que o chamado se dirigia a outra pessoa. Olhou de novo para a mulher, e esta, apontando com o dedo, deu a entender que era o próprio que estava chamando. De relance, viu o relógio, pensando: - Mas logo agora!
     Rapidamente atravessou a rua.
     - A senhora esta me chamando?
     - Estou sim. Preciso de seu auxílio.
     - E em que poderei ajudá-la?
    - É o seguinte: eu não sou de Belém. Vim aqui passar poucos dias e queria conhecer o túmulo de meus avós que estão sepultados neste cemitério. Mas confesso que fiquei receosa de entrar sozinha. Já é um pouco tarde, e o cemitério está deserto. O senhor poderia fazer o grande favor de me acompanhar até lá dentro?
     Contrariado, pensando que o expediente chegava ao fim - Flávio estava apressado a fim de chegar em casa - e ele ainda teria que se demorar, custou um pouco a responder. Refletiu e, visto que a mulher não era de Belém e não ficaria bem não ser hospitaleiro, acabou aceitando acompanhá-la.
     - E a senhora sabe onde é a sepultura?
     - Não, não sei. O nome dele era fulano de tal. Mas, se não for muito incomodo para o senhor, procuraremos. Afinal, o cemitério não é tão grande!
     Ato contínuo, seguiram para a ala esquerda, vendo e examinando as sepulturas, procurando o nome que a mulher havia dado como sendo o do seu avô. E, na busca, percorreram todo o cemitério. Em alguns túmulos demoravam-se um pouco, como o do General Gurjão, o da Preta Domingas, o do Menino Cícero, o de Raimundinha Picanço. A mulher perguntava quem eram, e Flávio explicava que o primeiro havia sido herói na Guerra do Paraguai, e os outros três eram considerados milagrosos pelo povo, a quem faziam culto as segundas-feiras, solicitando graças. A mulher parecia não mais querer sair dali, e Flávio, já arrependido de ter se mostrado hospitaleiro e cavalheiresco, só pensava em ir embora.
     - Mas que raios! pensava - acertou logo comigo. Tanta gente nesta cidade e havia justamente de ser eu a passar ali naquele momento. Tomara que ela ache logo, que me vou.
Mas a pesquisa terminou e não foi encontrado o túmulo dos avós da mulher. Satisfeito, pensando que já ia, Flávio falou:
     - É. Parece que não é aqui, não. Naturalmente Ihe informaram mal. Deve ser lá no Santa lzabel. A senhora naturalmente vai procurar amanhã.
     - Não, não me enganei, não. Apenas talvez não esteja sepultado em túmulo e sim seus ossos estejam numa uma funerária. Onde será que as guardam?
     - Francamente, não sei.
     - Olhe, talvez seja ali, disse a mulher apontando para a ala lateral à Capela do cemitério. Só mais um minuto, está bem?
     - Está, mas não posso demorar muito. Meu expediente na repartição já terminou e devo bater o relógio de ponto.
     - É só um minutinho...
     E dirigiram-se para a sala onde eram guardadas as umas funerárias. Entraram. Hora crepuscular, quase mais nada se via na sala. Mesmo assim, a mulher, sempre chamando Flávio, dirigiu-se para a parte dos fundos. O homem seguiu-a.
     Olhou determinada urna e disse:
     - Parece que é esta. Venha ver.
     Flávio foi, agradecendo a Deus haver terminado aquela via crucis atrás da ossada de um defunto que ele não havia conhecido e nem tampouco ouvido falar. Afinal, com 51 anos no costado, mesmo sendo motorista profissional, era a primeira vez que se via naquela situação.
     Quando estava próximo à urna, tentando ler o nome inscrito na parte superior, ela chegou-se a ele, até quase colar os corpos. E, inesperadamente, abraçou-o e começou a apalpá-lo, ao mesmo tempo em que tentava beijá-Io...
     - Meu querido ...
    Apanhado assim, de surpresa, naquele local ao mesmo tempo sacro e sepulcral, Flávio não soube o que pensar.
    - ... tenho 51 anos ... mas logo comigo ...? ... não sou bonito... por que...?... logo aqui...?... será que é doida...?... por que ? ... logo eu... por que aqui...?... Tanto homem jovem por aí...... por que ...? .. tanto lugar para fazer amor ... logo aqui ...!
     Num relâmpago, pensava todas essas coisas, enquanto era apalpado por todas as partes do corpo, principalmente no sexo. Rapidamente se recobrando, Flávio a empurrou com violência ... - Mas que é isto? Respeite ao menos o lugar...
Leitura recomendada
Saltou para trás, procurando a porta. Ao alcançá-la, de costas, procurou ver a mulher. Para seu espanto, tal como se fosse fumaça, ela desaparecera... Apenas as urnas funerárias continuavam em seus lugares nas prateleiras e ... nada mais ...
     Flávio gritou, ao mesmo tempo em que procurava o portão de saída. Correu olhando para trás ... porém, inútil! Ninguém o seguia; a mulher desaparecera mesmo.
     Nervos tensos, tomou o jeep. Mas não conseguia controlar seus movimentos. Esperou alguns minutos, e, tão logo pôde, arrancou, imprimindo tal velocidade no jeep que chegou rapidamente ao local de trabalho.
     Os funcionários retardatários que ali estavam viram chegar um Flávio irreconhecível, sem a costumada serenidade, sem a voz calma de sempre. Flávio procurava falar tudo de uma vez, querendo contar aos companheiros o ocorrido ...
     No dia seguinte, Flávio não foi trabalhar. Nem no outro. Nem no que o seguiu. Procuraram notícias junto aos familiares. E então souberam ...
     Estava internado há três dias no Hospital da Beneficente Portuguesa. Com alta febre ... Delirando ... Dizendo coisas estranhas ... que um fantasma de mulher o quis amar dentro do Cemitério da Soledade... 
Curiosidade: Sthefanie Espinola fez uma foto-hq bem interessante dessa mesma estória. 
"Crie se quiser ser original.
Inove se quiser ser genial.
Cometa loucuras se quiser ser uma lenda."
(Gustavo Pires Batista)

Fontes consultadas:

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

LENDAS DO AMAPÁ - Lenda waiãpi do fim do mundo

Mairi, a lenda do fim do mundo  

Os Waiãpi são um povo   de língua e   tradição cultural  tupi-guarani que vivem nos dois lados da fronteira que separa o Brasil da Guiana Francesa. Originários da margem direita do rio Amazonas, os Waiãpi habitavam no século XVII a região do baixo Xingu, ocupada também pelos índios Juruna, Kuruáia e Pacajá. Com a colonização portuguesa, no século XVIII eles migraram gradativamente para as regiões onde ocupam atualmente, para manter a sua cultura secular e sua sobrevivencia como etnia. De todos os povos indígenas da Amazônia, os Waiãpi são um dos raros que ainda se mantêm pouco aculturados, guardando suas tradições e costumes que mereceram estudos da antropóloga belga Dominique de Galois, que registou a presente lenda.
Fotos de Dominique Gallois (laterais) e da Exposição "Povos Indígenas do Brasil" (centro)
"Nós somos Waiãpi. Nós moramos no Brasil, no estado do Amapá. Vivemos dentro da Terra Indígena Waiãpi, com 604 mil hectares. A demarcação começou em 1994 e terminou em 1996. Cada grupo Waiãpi mora em uma aldeia separada. Alguns moram muito longe, outros moram perto. Nós temos 13 aldeias, e os Waiãpi ainda vão aumentar. A vida waiãpi é diferente da vida do branco. Nós usamos tanga, urucum, flecha e colar de miçanga. Nossa alimentação também é diferente. Comemos beiju e carne de caça - por exemplo: caititu, veado e anta. Nós não perdemos a nossa bebida. Ela é feita de mandioca. Nossas aldeias são diferentes das cidades. Nós derrubamos poucas árvores para fazermos as roças."
Texto do livro "Artesanato Waiãpi" do CTI - Centro de Trabalho Indigenista

Índias Waiãpi - Década de 80 
(autor não identificado)
 Origem - Esta estória foi contada há muitos séculos pelos antepassados dos Waiãpi, ancestrais de seus ancestrais, estória que continua viva e vem sendo repassada de geração em geração, pela tradição oral.
      Conta a estória que o herói criador Ianejar, criou os primeiros Waiãpi, homens grandes e ornamentados com um cocar de enviras até os pés, inclusive os brasileiros e os franceses. A população era grande, que mais parecia árvores na floresta, "não podiam nem andar". Cada povo seguiu seu destino, procurou novas terras, sempre se fixando às margens dos rios. Os brasileiros foram para o seu lugar e os franceses para o outro lado do rio, somente os Waiãpi permaneceram naquele lugar. O êxodo ocorrido naquele período não diminuiu entretanto a população, pelo contrário, a cada dia aumentava mais - a floresta já não comportava tanta gente - os tempos eram difíceis, a estiagem castigava a terra, os rios e igarápes estavam secando e a flora e a fauna encontravam-se em completa destruição. Resolveu então Ianejar queimar a terra.

Construção - O criador de tudo e de todos reuniu o Kae'te e ordenou que todos os Taimiwer (antepassados dos Waiãpi) fossem para a floresta em busca de madeira e argila para a construção da Casa de Argila onde se abrigariam todos aqueles escolhidos, abastecidos de água e alimentos, numa preparação para a queima da terra ordenada por Ianejar. Assim foi feito. Os homens da floresta levaram dias e dias trabalhando na tiragem de madeira e argila e começaram a construção de uma grande casa redonda, toda em madeira, recoberta de argila, a qual deram a denominação de Mairi, que significa fortaleza em tupi-guarani. Nessa estrutura, entrelaçaram a madeira, espalharam a argila e subiram paredes arredondadas e bastante grossas para não queimar, e na parte mais alta, uma torre bem alta e arredondada com uma abertura no meio de onde pudessem enxergar até o final da terra.

Cataclismo: fogo e dilúvio - Não chovia e a terra estava seca. Secaram os pequenos igarapés, os pequenos rios e os grandes também. Começaram a morrer os peixes e os pássaros. Ianejar volta para seu povo e, na sua viagem de regresso, encontrou o Antiguaçu, pássaro encantado mitológico que soltou urn canto triste ao aproximar-se do criador, anunciando a realidade do povo Waiãpi: "Secou, secou ... ". O pássaro entregou a Ianejar um Pararê, papel mágico que mostrava o futuro, através do qual pôde ver a terra queimando, sendo arrasada pela fúria do fogo.
      Ianejar ordenou então que os escolhidos fossem para Mairi, levando consigo todos os seus pertences, indumentárias de festas, flautas do turé, seus potes com água e animais de criação para a garantia da alimentação naqueles momentos de dificuldades, principalmente a manutenção das espécies no futuro: cotias, pacas, mutuns, porcos, jacarés, jabutis, araras, papagaios, galinhas, macacos e todo o tipo de animal da floresta. Todos se instalaram como puderam, dividindo o espaço com os animais, em total desconforto. Alguns acreditavam que a comida era insuficiente e resolveram ir até a roça com a finalidade de trazer mais alimentos: mandioca (para a feitura de beiju e farinha), bananas e pupunhas. Uns foram e voltaram e outros nunca conseguiram retonar.
      O tempo urgia, o momento anunciado se aproximava e então Ianejar fechou todas as entradas da Mairi. Os que chegaram a tempo ficaram.
      O fogo se alastrou com rapidez, a ventania era intensa, chamas gigantescas, labaredas monumentais, varrendo rapidamente tudo o que encontrava no chão e no céu, queimando por todos os lados e em todas as direções, cercando totalmente a casa de argila. Os escolhidos jogavam água uns nos outros e molhavam o chão para evitar a queima dos pés. A fumaceira era intensa, não se enxergava um palmo diante do nariz e o calor era quase insuportável. A queimada durou a noite toda. Do alto da Mairi podia-se observar o mar que o fogo produzia. A argila queimou e ficou vermelha. Ao meio-dia o fogo passou pela Mairi e continuou queimando, seguindo seu caminho devastador.
      Ianejar olhou novamente no Parerê acompanhando a devastação até que o fogo caiu no buraco do final da terra. Quando o fogo passou, a casa esfriou. Mairi continuava imponente e todos os que nela se encontravam estavam salvos e prontos para dar continuidade a espécie. Pouco a pouco voltaram a si e uma nova realidade se preparavam para enfrentar. Ianejar corre novamente os olhos no Parerê, momento de muita tensão. Espantado, comunica aos sobreviventes que o pior ainda estava por vir e anuncia a chegada de um dilúvio, para lavar e purificar a terra.

Dilúvio - Ianejar ordenou a saída de todos os que ocupavam a Mairi e indicou urn lugar bem alto, acima do Paraná (grande rio), para que lá todos fossem e levassem os animais e pertences juntos, pois estava para começar o grande dilúvio, que viria para lavar a terra que queimara, fazendo a limpeza e purificação. Mairi esfriara e se tranformara em uma Tucuruoka (casa de pedra).
      O dilúvio se aproxima, a água é grande, com altas ondas, a correnteza muito forte e arrasta tudo o que encontra. Mairi, cercada por todos os lados de água, fortes correntezas, não suporta, é levada pelas águas até o final da terra onde, segundo a estória, ninguém havia visitado. O povo chorou a perda de Mairi, levada pelas águas para um lugar muito distante, onde as águas secam, onde é o final da terra.
      No lugar onde havia sido ordenado que todos se acomodassem, nada existia, razão pela qual Ianejar criou o primeiro animal, o tamanduá. Depois todos os animais até hoje existentes; criou os igarapés, rios e mares, as florestas, as matas e cerrados e ensinou os escolhidos a construírem suas casas, a fazer comida (farinha de mandioca), a fazer o caxiri (bebida de mandioca), a dançar e tocar flauta.
      Com o cenário totalmente modificado e pronto para a realização da vida, os Waiãpi foram deixados pelo criador, com um único pedido: para que crescessem e se multiplicassem. A vida tinha sua rotina, viviam da caça, da pesca e do plantio da mandioca. O resultado foi comemorado durante vários dias, cantando e dançando, até que tudo se acabasse e houvesse a necessidade de sair em busca de tudo que era novo .


Reencontro da Mairi - Certo dia, Tamo Kuresisi (ancestral Waiãpi) ficou a observar o infinito do horizonte, imaginando se o mundo se resumia até onde a vista alcançasse; largou tudo e resolveu visitar a borda da terra, beirando os igarapés, os rios, as praias do grande rio que denominavam de Paraná (que seria o rio Amazonas). Ele tinha medo de andar, pois o movimento de ida e vinda da maré lhe assustava. Observou que não tinha nada além da água, só as borboletas que, com suas pinturas faciais, eram as donas do final da terra amarrada com cipó ao final do céu, assim irnaginavam os índios. As borboletas eram responsáveis pela substituição daqueles cipós que apodreciam, elas o trocavam e amarravam novamente. Aí então Kuresisi ficou preso na seiva da Maçaranduba e percebeu que a borda da terra era muito dura, porém, mole depois dela.
      Sempre fugindo da grande maré, Kuresisi resolveu conhecer o que havia além do Paraná, desta feita levado pelo Beija-flor, pássaro que tem uma enorme capacidade de voar grandes distâncias. Atravessou o grande rio e pousou em terras dos brasileiros, onde, espantado, reconheceu nas margens do rio Amazonas a Fortaleza de São José de Macapá, como sendo a Mairi construída pelos ancestrais de seus ancestrais, em obediência a Ianejar, que foi arrastada pelo dilúvio até aquele lugar.
Encontrou o forte tomado pelos brancos, fazendo dele morada de soldados e cárcere de índios escravizados. Observou o sofrimento de seus irmãos e da raça negra que não conhecia até então. Retornou para a tribo conduzido pelo beija-flor e contou o que viu para os Waiãpi, que desde aí passaram a temer e evitar a presença do homem branco.
Fonte do Texto: Revista Amazon View - Ano VI
Edição 44 / 2002

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

LENDAS - A Lenda do Jurutaí

Jurutaí é uma ave noturna, de canto agourento, "melancólico e estranho, lembrando uma gargalhada de dor". Também é chamado de Urutau e é cercada de mistérios. Uma ave rara que  inspirou uma singela e melancólica lenda (tal qual seu canto), representada nesta animação contada pelo Grupo Girasonhos. Bela estória e bela música!
Veja aí o Jurutaí (Urutau), seu canto e em seguida a animação da lenda. 


Canto do Urutau (Jurutaí)
A filmagem da ave é creditada à Douglas Fernando Meleti

"O amor platônico mais cruel que existe 
é aquele que está constantemente ao alcance dos olhos."
M. M. Soriano

Lenda do Urutau - Animação do Grupo Girasonhos
(com ilustrações de Walter Saiani).

"Amo como ama o amor. 
Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar.
 Que queres que te diga, além de que te amo, 
se o que quero dizer-te 
é que te amo?"
Fernando Pessoa

A Lenda do Jurutaí 
Ilustração: Fernando Villela
Muito tempo atrás, no fundo da floresta amazônica, havia um pássaro chamado Jurutaí. Uma noite, Jurutaí olhou para cima, através do ar quente, e viu a lua. Ela estava completamente redonda. A luz prateada brilhou sobre a face de Jurutaí como se a lua estivesse se esticando para tocá-lo. E Jurutaí se apaixonou.
Jurutaí se apaixonou pela lua e quis ir até onde ela estava. Assim, voou até o topo da árvore mais alta que podia ver. Mas a lua ainda estava longe. Ele voou até o cume de uma montanha. Mas a lua ainda estava longe.
Então ele voou até o céu. Jurutaí bateu as asas, subindo, subindo, até o ar ficar rarefeito. Mas a lua estava muito longe. O pássaro continuou voando para cima até as asas doerem, os olhos arderem e parecer que cada respiração só enchia seus pulmões de vazio.
Queria prosseguir, mas era muito difícil. A força de suas asas chegou ao fim e de repente ele começou a cair. Rodopiava, através do ar negro, e batia as asas céu abaixo. Ele caiu de volta nas folhas úmidas e perfumadas das árvores. E se empoleirou ali, piscando ofegante para a lua. Ela estava distante demais para que ele a alcançasse. Assim, tudo o que Jurutaí podia fazer era cantar para ela. Ele cantou a mais bela canção que pôde.
Uma canção cheia de tristeza e amor, que se espalhou pela floresta.
A lua olhou para baixo, mas não respondeu. E lágrimas encheram os olhos de Jurutaí. Suas lágrimas rolaram pelo chão da floresta. Encheram vales e escorreram em direção ao mar. E dizem que foi assim que o rio Amazonas surgiu.
Ainda existe um pássaro chamado jurutaí que vive na floresta amazônica hoje em dia. Às vezes, na lua cheia, ele olha para o céu e canta. E ouvi falar de povos indígenas que acendem fogueiras quando a lua cheia brilha e cantam e dançam para fazer o jurutaí cantar. Eles sabem que cantar a mais bela canção que se conhece é a melhor maneira de se livrar da tristeza. E acreditam que deveríamos acender fogueiras no coração quando o jurutaí dentro de nós se cala.
Leitura indicada
Cobra-grande: histórias da Amazônia, de Sean Taylor, traduzido por Maria da Anunciação Rodrigues, colorida e ricamente ilustrada por Fernando Vilela (Edições SM, 2008). Nove lendas que correm há centenas de anos no boca-a-boca dos ribeirinhos da Amazônia foram ouvidas e ganharam vida nesta obra do escritor inglês, que fez três viagens pelos afluentes do Amazonas.
Mais informações desta obra em:


 Outras versões de lendas sobre o Urutau (Jurutaí) são encontradas no textolivre.com.br - LENDAS DE URUTAU, onde conhecemos as seguintes estórias:
  1. Lenda Tupi-Guarani
  2. Lenda Amazonense
  3. Lenda Portuguesa
  4. Lenda Asteca
  5. Lenda Religiosa