As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Histórias da Vó Nikita - O Poço Fundo (Um conto da Cobra Norato)

Em um grandioso rio, neste mundaréu que é a Amazônia, existia um recanto famoso por suas lendas e mistérios. Lugar de encantos, marcado por uma história conhecida e comprovada na mais ferrenha convicção por todos que ali transitavam... nas noites de lua cheia.
Trata-se do rio Jacaré Grande. Trata-se do imaginário popular, lá para as bandas de Breves. Trata-se de mais uma das histórias de Vó Nikita. 
Nikita (1986) Monte Dourado - PA
Ah, minha avó! Jamais posso eu esquecer de suas narrativas e do quanto me despertaram para a leitura. Histórias do pensamento  ribeirinho de outrora, meus antepassados, que ainda tem a força mística de produzir encantos. Acreditem! Através destas histórias neste blog, minha avó Ana reencontrou uma neta afastada e sem contatos há 20 anos. Faces que o destino nos mostra... pudessem ser sempre felizes. Bem-vinda Ana Caroline! Bem-vinda ao lar de sua avó Ana Castelo! A coluna mais antiga desta família, mulher perseguidora de sonhos e testemunha dos fatos que conta em suas Histórias da Nikita.

Era uma casa tão alegre! A festa corria solta da manhã até o raiar de um novo dia. Como sempre acontecia, os caboclos vinham de todas as paragens para a festança, capazes de remar horas seguidas em suas montarias para não perder a animação. Tempo de namoros - em uma destas formou-se o casal Nikita e Branco Velho, meus avós maternos - tempo de danças, fofocas, reaver os amigos e sair da rotina diária na vida ribeirinha. Esta era a festividade em um barracão, avançado na curva do rio e preparado para receber umas 100 pessoas. Festa que os ilustres anfitriões faziam sempre, já famosas, no surgimento de cada novo ano, chamando os parentes e amigos. Isso meus amigos era nos anos de 1930 em uma Amazônia encantada de histórias e superstições. Minha avó assim o disse. 
Em um destes dias, quando o pau torava e a caboclada dançava fervorosamente ao som do pistão, um ilustre visitante chega no local. Terno branco, chapéu de palha no melhor estilo, bem alinhado, com uma elegância e trejeitos que logo chamou a atenção das moças, sempre em buscas de bons partidos. Este com certeza era um... pensamento em cada mocinha solteira, admiradas do rapaz, que se revelou o melhor pé-de-valsa naquele local.
Nada de Uiara, nada de boto. O rapaz era conhecido por muitos naqueles cantos, apesar de conservar sempre um quê de mistério. Vez por outra sumia e reaparecia, contava histórias de andanças neste mundo e nada se conhecia de seus familiares. Seu surgimento causava uma ciumeira entre os caboclos, que não eram páreos aos seus galanteios com as moças, a esta altura animadas e desejosas de uma dança. Todas logo vinham engrossar as fileiras de admiradoras em uma saudação de suspiros unânimes: 
- Como vai Norato?
 
Cobra Norato (Ilustração do educacao.uol.com.br)
Solte a imaginação!! Deixo para você a interpretação da imagem!

O jovem, sempre cordial, era todo atenção às moças. Dançou com tantas quanto solicitado, tornando-se o protagonista maior no salão daquele famigerado barracão às margens do Jacaré Grande. Conversa vai e conversa vem, logo anoiteceu, mostrando o resplendor de uma belíssima lua cheia. 
Foi então que Norato mais uma vez deu pinta de seus ares misteriosos. Coisas de rapaz esquisito... no melhor da festa, quando os ponteiros do relógio caminhavam para a meia-noite, cismou de querer ir embora. Ora por que? Se lá fora há só o breu da noite e as horas vem anunciando um novo ano a despontar! O desejo de confraternização e amizade era mais forte do que nunca em cada coração, não só renovados na esperança, como também necessitados de exteriorizar, indistintamente, os melhores sentimentos em efusivos abraços. Principalmente entre as moças, eternamente sonhadoras, onde Norato era o alvo de seus desejos. Assim, não poderia - nem deixariam - de forma alguma sair do local, neste dia de lembranças únicas...  e impossivelmente críveis... como então se verá.


Brilha lua! Mostra tua beleza... cheia de graça, de luz e de encantos. Lua cheia é senhora da noite, farol nas matas distantes e inspiração aos corações... Não no de Norato. Triste e sozinho, vagando na noite encantada como a cobra maior do rio, revelada pelo pálido brilho de toda lua cheia. Vaga solitário, se escondendo de tudo e fugindo de todos, ocultando sua triste sina de encantado. Serpenteia nos rios e matas desabitadas o horror de um monstro lendário, descortinado e pujante em todo período da lua cheia, desde a meia-noite do primeiro dia.

Foto: Octavio Campos Salles
Fonte: cativagoogle.blogspot.com.br
Dizem que vive por aí, está no rio, está na mata. O caboclo ribeirinho o teme e qualquer banzeiro mais forte traz a lembrança de sua temida proximidade. 
Testemunhas oculares da cobra gigante quase não há, só as histórias  e a certeza de sua presença. Histórias como a do Poço Fundo, local desabitado há mais de 80 anos e com uma superstição viva no coração dos que transitam por ali. Nas noites de lua cheia, quem se aventura em passar perto, jura que ouve, com a atenção sedenta para as lendas, uma música de pistão soando na noite, seguida de murmúrios, canto do galo, latido, miado e um vozerio sem causa aparente... Parece uma festa!
 
  
Não podendo conter sua ânsia e impossibilidade de retirar-se, Norato vê a meia-noite aproximar-se como o pesadelo de seu destino. Falta pouco, seu corpo é tomado de uma febre repentina e suor crescente. Já não encara ninguém, sua face parece doentia, pálida e descamativa. Há um jeito de ocultar-se? Com as forças humanas que lhe restam pede a um dos anfitriões um local onde possa descansar um pouco, informa suspeitar de malária e é encaminhado para um dos quartos. Pede momento a sós, não quer ser procurado e nem assistido, alguns minutos de repouso são o bastante para recuperar suas forças.  Agradece e tranca a porta.  Em sua mente a oportunidade criada para sair do local pela janela, enquanto os festejos do ano novo distraem a atenção de todos. É hora de partir e deixar para trás as lembranças felizes. Serão seu alento e resto de humanidade quando na capa de cobra, por toda aquela sua angustiosa semana de lua cheia. 

Suposta foto de 1932, famosa entre os criptozoologistas. Mostra um Sucuriju Gigante, que foi morto na fronteira com a Venezuela pelos guardas de fronteira brasileiros. Serão verdadeiras as dimensões? Indiscutível, porém, os relatos de encontros com animais muito maiores que os atuais. Só um lembrete de onde nascem as lendas. Nem tudo é exercício da imaginação. 
Fonte da foto: northamericanmonsters.blogspot.com
Um novo ano é saudado com o entusiasmo de velhos comprades ribeirinhos. Por alguns minutos a atenção é toda centrada na confraternização no salão. Norato não está ali, fato inesquecível no coração de uma das jovens no local, cativa da paixão pelo rapaz. Foi ver as condições do mesmo, cuja informação circulante era que estava em repouso devido um mal-estar súbito. Bateu na porta - trancada - chamou e nada de respostas. A moça, com a preocupação dispensada a quem se gosta, olhou por uma fresta nas tábuas da parede. Horror!!! Seu coração acelerou ante a visão de um sucuriju gigante, com escamas negras e brilhantes na luz do lampião. Rolos grossos como nunca vira, espalhando-se por todo o quarto e querendo projetar-se pela janela. Desespero!!! Lembrou do jovem e foi tomada pela certeza de ter sido morto por aquele monstro. Isso tudo em segundos, culminando com o mais terrível grito que todos por ali ouviram. Espalhou-se o caos frente a informação de tal cobra no local. A casa rangeu com a algazarra e a cobra, sentindo as vibrações do desespero, rompeu a parede da casa mergulhando no rio com a força e peso de uma lenda. Atrás de si arrastou tudo ao fundo, nada restou, tudo foi tragado por um redemoinho gigante. Nem tábua, nem alicerce, nem gente, nem bicho... tudo sumiu como encanto no brilho daquela lua cheia. 
 

Restou esta narração, contada e conhecida por minha avó Ana (a Nikita), de um local encantado que sumiu com tudo que tinha, como um poço fundo, ecoando a música e murmúrios de uma festa sem fim na curva de um rio, o Jacaré Grande.  Lugar  de encantos e exercício da imaginação frente ao desconhecido, predisposto a acreditar em fatos como esse, onde reinam as lendas e, da boca dos mais vividos, aprende-se A LENDA DA COBRA NORATO.

Texto de Rogério Castelo baseado nas narrativas de sua avó Ana Castelo.
Olha aí, nada de gaiatice de que tô segurando a cobra!!! 
Pra mim essa é uma cobra-fêmea, é a Maria Caninana!!!
Nunca ouviram falar? De onde vocês acham que vinha o medo de Norato, 
apresentado como um sujeito de bom coração.
Ah!! Mas isso é uma outra estória!!!

Vida Maria (Animação)

Vida Maria é um curta-metragem em animação 3D que tem como personagem principal Maria José, com seus sonhos interrompidos ainda criança, quando precisou abrir mão de suas descobertas, das letras e dos estudos, para se dedicar ao trabalho. Ela cresce, conhece Antônio, se casa e tem filhos, entre eles, Maria de Lourdes. Mais um ciclo se repete, pois Maria José age com Lourdes exatamente como sua mãe agiu, reproduzindo o seu passado no futuro da filha.


Direção: Márcio Ramos Evangelista
(2006 - Brasil)

"O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele."
(Immanuel Kant)

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Homenagem à minha mãe

Neste dia, mais uma benção em minha vida. É aniversário de 65 anos de minha mãe Alzira Castelo. A melhor forma de um filho honrar os pais é com o respeito e atenção. Reservo também uma homenagem neste blog a pessoa mais importante em minha vida neste mundo.
Deus abençoe 
com todo cuidado e carinho
quem sempre foi uma coluna forte 
em sua família:
Alzira Castelo

Para Sempre

Por que Deus permite

que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Morrer acontece

com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade

Desenho de Isabelly Castelo para sua avó Alzira Castelo. 
Image du Blog cpd.centerblog.net
Source : cpd.centerblog.net sur centerblog.

sábado, 5 de maio de 2012

O Curiaú (Fala Comunidade - Dezembro de 2011)

Vídeo apresentado pela TV-AP, em dezembro de 2011, sobre o Curiaú. A reportagem fez parte da série Fala Comunidade, apresentada no programa Amazônia TV.

Apresentação do Amazônia TV: Seles Nafes
Reportagens: Worchielly Costa / Gilberto Pimentel
Imagens: Ozânio Lopes
Veja o vídeo NESTE LINK

São pontos abordados:

1º programa: Informações gerais
"O Curiaú é a cara de Macapá! Não tem como falar de Macapá sem lembrar da nossa comunidade mais famosa. Área de Proteção Ambiental (APA) em terras de tradições seculares, o lugar se transformou em um dos mais belos cartões postais do Estado. Os relatos de moradores mais antigos, as belezas e curiosidades do Curiaú no Fala Comunidade." (Sele Nafes)
A comunidade do Curiaú distancia-se 12 km do centro de Macapá, uma distância percorrida em poucos minutos até a rodovia AP-70, que serve de entrada para a vila.
Até a década de 1960 os moradores do Curiáu viviam sem energia elétrica. Quando essa realidade difícil foi vencida, foram construídos Posto de Saúde e a escola de ensino fundamental.
Foi a primeira comunidade do Estado a ser oficialmente reconhecida como área remanescente de quilombo em 1999.
A APA do Curiaú, criada para proteger e conservar os recursos naturais, foi formada por 04 comunidades: Curralinho (em processo de reconhecimento como área quilombola), Casa Grande, Curiaú de Dentro e Curiaú de Fora. Ao todo são mais de 1.600 habitantes.
O Curiaú é lembrado também pela devoção religiosa a São Joaquim, padroeiro da comunidade. Além de orações, tem uma festa movimentada com o marabaixo, ladainhas e folia.
A comunidade trabalha para conservar as tradições. O grupo Raízes do Bolão transmite às novas gerações os valores do marabaixo.

2º Programa:  Principais problemas
"A palavra tranquilidade, ao longo dos anos, vem sendo eliminada do dicionário dos moradores e vizitantes. As festas de aparelhagens tiram o sossego e provocam outro problema, acidentes de trânsito, influenciados pelo consumo de álcool na rodovia AP-70." (Seles Nafes)
O problema da poluição sonora no Curiaú começou há cerca de 16 anos quando casas noturnas do local iniciaram a realização de festas durante a semana. De lá pra cá, a Associação de Moradores começou uma briga com os donos de estabelecimentos, que foi parar na justiça. O problema afeta até quem mora mais afastado do barulho. Moradores afirmam estarem sendo afetados na saúde e na perda de noites de sono. Segundo a Associação de Moradores, como a área é remanescente de quilombo, a SEMA só deveria liberar a licença de funcionamento dos estabelecimentos depois de autorização da associação.
Os moradores também se preocupam com o alto índice de acidentes na rodovia AP-70, em 2011 foram 04 mortes, por causas de embriaguez ou abuso da velocidade, sem falar das colisões com animais na pista (no segundo semestre de 2011 foram quatro acidentes dessa natureza e uma morreu).
Os serviços de saúde são outro alvo de reclamação em função do aumento da população. O Posto de Saúde não estaria atendendo as necessidades dos moradores.
Há deficiência também no serviço de esgoto sanitário e água tratada, até hoje a população continua sem contar com esses serviços básicos, sendo comum a utilização de poços amazonas.
Apesar da pequena população, os moradores reclamam ainda dos altos índices de assaltos.
A última queixa é da invasão urbana que a vila vem sofrendo nos últimos anos.

3º Programa:  A comunidade e suas reivindicações no programa ao vivo
O Batalhão Ambiental foi informado e cobrado sobre os abusos da poluição sonora e fluxo de animais na rodovia (causa de acidentes).
Dona Esmeraldina fala do descarte de lixo na localidade, muitos têm transformado as margens da rodovia em lixeira. 
É reivindicada também a organização no sistema de transportes urbanos para a localidade (ocorre muita demora dos ônibus).

 O Curiaú oferece um amplo campo de pesquisas no âmbito histórico, ambiental, turístico e cultural. A Biblioteca Ambiental da SEMA em Macapá dispõe de material para pesquisas, principalmente, de cunho ambiental (a APA do Curiaú constitui-se em uma das 05 unidades de conservação de jurisdição estadual, pela SEMA-AP). 
Alguns dos materiais disponíveis para consultas são:

"APA do Rio Curiaú: Plano de Manejo"
Publicação da SEMA-AP com um estudo sócio-econômico-ambiental da região. Constitui-se em um instrumento de gestão de unidades de conservação que serve de suporte para tomada de decisão da comunidade e do poder público sobre a ocupação e uso da área e dos recursos naturais. Foi elaborado com a participação de técnicos, pesquisadores e moradores das comunidades locais. Apresenta 220 páginas e foi publicado em 2010.


"Apa do Rio Curiaú: Planejamento e Zoneamento"
Este livro complementa o Plano de Manejo mencionado e visa contribuir no ordenamento territorial da unidade de conservação, definindo as ações que orientem ou direcionem o desenvolvimento e a proteção de certas áreas - propostas que sejam condizentes com as diretrizes de sustentabiblidade ambiental. Foi publicado em 2010 e tem 80 páginas.



"Curiaú: a resistência de um povo"
Livro de Sebastião Menezes da Silva que tem por objetivo resgatar a história do povo do Curiaú, desde a sua formação até os dias atuais. O autor procura, de uma forma bem simples, resgatar fatos verídicos da comunidade e fazer uma viagem através do tempo, descrevendo a vida de um povo que vem resistindo e conservando a sua cultura. Encontramos informações diversas como: festas, costumes, conflitos, fatos engraçados, etc. Tem 98 páginas e foi lançado em 2004.


"Histórias do meu povo"
Publicação de Esmeraldina dos Santos sobre seus antepassados. Trata-se de um trabalho pequeno, feito com naturalidade, talento e profundo amor da autora pelas pessoas e lugares que descreve. São memórias de resgate da história de um povo. Entre os fatos interessantes, a origem do nome Curiaú. Segundo a autora, os primeiros moradores consideravam o lugar bom para se "criar" boi, chamados de "u" (alusão ao mugido). O Criaú evoluiu então para a forma atual de Curiaú. Histórias na obra, que tem 40 páginas e foi publicada em 2002.

OBS: Esmeraldina dos Santos é autora também de livro infantil, baseado em suas lembranças (Veja aqui).
Estas obras estão no acervo da Biblioteca Ambiental da SEMA em Macapá, que não se limita a estes materiais sobre o Curiaú.
No Amapá é notório que, anualmente, muita coisa de cunho científico é produzida, não sendo, porém, conhecida pela sociedade. Fica aqui um informal convite aos estudiosos, acadêmicos e pesquisadores em geral nestas terras amapaenses, se quiserem, o encaminhamento de material de pesquisas ao acervo da Biblioteca Ambiental da SEMA em Macapá será muito bem-vindo. Uma forma de enriquecer o acervo de nossa Biblioteca Ambiental, divulgar o trabalho e contribuir para a formação de uma memória científica mais abrangente.

 "O mundo é um belo livro, mas com pouca utilidade 
para quem não sabe ler." 
(Carlo Goldoni)
    
VISITE E CONHEÇA NOSSAS BIBLIOTECAS EM MACAPÁ.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Tradição Secular: Início do Ciclo do Marabaixo (Abril de 2012)

Texto do Jornal dos Municípios do Amapá
de 12/04/2012.
Na Igreja de São Benedito, missa integra programação do marabaixo.
 Ciclo do Marabaixo 2012 inicia com festas na Favela e Laguinho
   
É tempo de fogos, flores, cantos, saias, caldo crianças, jovens, idosos, homens e mulheres nos bairros Laguinho e Favela. Começou o Ciclo do Marabaixo, maior combinação de fé, tradição, respeito e religiosidade, onde o preconceito e ignorância são descartados para que a principal identidade do povo amapaense ganhe espaço nas rodas.
Em cada bairro, os festejos se dividem entre duas famílias tradicionais, multiplicando em quatro as opções para quem quer conhecer e participar das festas do Ciclo do Marabaixo, que só acaba no Domingo do Senhor, em junho. A programação iniciou no dia 07 de abril.
Em Macapá, Favela (hoje chamado de Santa Rita) e Laguinho, nascidos da migração dos moradores negros do centro da cidade, reúnem pessoas de todos os cantos do Amapá nas casas de Tia Biló, Mestre Pavão, dona Dica do Congó e Natalina. Elas são descendentes dos primeiros moradores de Macapá, que moravam próximo à Igreja São José e tiveram que migrar para que o governador Janary Nunes construísse as casas oficiais e prédios públicos.
  
Ladrões retratam fase do povoamento de Macapá 
 
Dona Gertrudes Saturnino e Julião Ramos se dividiram para iniciar o povoamento do Laguinho e Favela. Memória: "Pra onde tu vais rapaz, por estes caminhos sozinho, vou fazer minha morada, lá nos campos do Laguinho...", composição de Raimundo Ladislau, e "...pelo jeito que estou vendo, querem me deixar sozinho, uns vão para a Favela e outros vão para o Laguinho...", de Gertrudes Saturnino, foram feitas para contar essa mudança do Centro para lugares mais afastados.
São versos, chamados de "ladrões", que desde o princípio contavam o dia-a-dia das famílias, que cantam a mudança e são repetidas nas noites de festa. Durante os festejos, a história dessa nação é cantada e "roubada" entre os cantadores que ainda fazem ladrões do cotidiano para não esquecerem suas raízes.
MATRIARCAS do Ciclo do marabaixo mantém tradição viva no Amapá.
Tia Biló é um exemplo de prosperidade, fé e dedicação ao marabaixo
  
As mudanças para manter viva a memória são entendidas pela matriarca do Laguinho, a Tia Biló, 87 anos, única filha viva do Mestre Julião e prima de Mestre Pavão. Na casa dela, assim como a dos demais festeiros, vive-se o marabaixo em cada canto. desde o ofertório, até as cozinhas com imensas panelas onde fazem o caldo, passando pelos quartos, com muitas saias e flores.
Tia Biló acompanhou a transformação do marabaixo tradicional ao atual espetáculo que hoje chama atenção de turistas e é reconhecido como a maior manifestação cultural do Amapá.
        
Preconceito vencido com música, flores e tambores

As famílias de Mestre Pavão, Tia Biló, dona Gertrudes e Dica do Congó tiveram que quebrar preconceitos e lutar para que a tradição não fosse sepultada pela ignorância. Enfrentaram com música, flores e tambores o preconceios de homens da Lei, de vizinhos que não aceitam a cultura secular e até de membros de Igrejas, mesmo sendo uma cultura popular sincronizada com a religião católica.
Mestre Pavão contava que após saírem do centro da cidade, alguns padres consentiam que eles dançassem marabaixo, desde que fora da Igreja de São José. Há três anos, um padre chegou a negar que as imagens dos santos festejados ficassem na Igreja São Benedito e tentou fechar as portas da Igreja para que os marabaixeiros não entrassem. "Nas últimas décadas houve quem chamasse a polícia, fizesse denúncias, recorressem à imprensa e até dessem tiros em frente às festas, sem contar que na Igreja cortaram  nosso microfone, mas não conseguiram nos abalar. Sabemos que não são todos os fiéis que agem assim. Nossa fé e respeito à tradição é mais forte e superamos tudo isso", conta Danniela Ramos.
No caso da Igreja São Benedito, o bispo da Diocese de Macapá, Dom Pedro José Conti, se envolveu e pediu que o padre se retratasse e hoje as portas voltaram a se abrir para a tradição. O padre italiano, que causou o transtorno, após o episódio, volta para a Itália e foi substituído pelo padre Daniel, que respeita e participa dos festejos.

Programação é bem diversificada e mantém tradição
Jovens cantadeiras são o futuro da tradição secular.
Além das rodadas de marabaixo, que são cinco, incluindo os dedicados à Santíssima Trindade e Divino Espírito Santo, quando os mastros são levantados após uma noite de festa, tem ainda a retirada dos mastros e das folhas de murtas, nas matas do Curiaú, missa, novenas e bailes.
No Laguinho, os dançadores e tocadores circulam nas ruas anunciando os festejos e espalhando as murtas, que espantam o mau-olhado. Gengibirra não pode faltar, assim como o caldo com muita verdura. É a vitória da tradição que hoje consegue levar para a festa pessoas de todas as idades e classes sociais.
Na casa em que morou Julião Ramos, onde o Grupo Raimundo Ladislau dança, crianças de 5 anos até idosos de 80 anos de idade participam de todo o processo da festa. As moças têm orgulho em vestir as saias rodadas e colocar flor na cabeça, as cantadeiras têm lugar de destaque. Na casa do Mestre Pavão, os 10 filhos e muito netos se revezam nos preparos. Na Favela, as famílias de dona Dica do Congó e dona Gertrudes, nos panelões  preparam com antecedência os caldos.


Fonte: Jornal dos Municípios do Amapá, de 12/04/2012 (página 8)

Referências para pesquisas

A Biblioteca Ambiental da SEMA-AP em Macapá disponibiliza para consultas os seguintes materiais sobre a cultura do Marabaixo.

"Marabaixo - Amapá Folclore" - Folheto de 33 páginas escrito e ilustrado pelo artista plástico R. Negrão, em 1990. 
Na publicação encontramos algumas melodias do marabaixo, datas principais, breve descrição da história e costumes. 
A principal referência da obra é a descrição do marabaixo (algumas de suas principais características) no formato de História em Quadrinhos (são 15 páginas dedicadas a isto). Esse material também pode ser encontrado nas Bibliotecas do SESC-Centro, Municipal de Macapá e Estadual Elcy Lacerda

Ilustração da página 19.

"O Marabaixo no Amapá: um estudo sobre o processo de mudança sócio-cultural e do artificialismo folclórico" 
Estudo de Fernando Canto apresentado como TCC no Curso de Ciências Sociais, na UFPA (1980).
Em 51 páginas encontramos informações como: origens e influências, lugares da dança, coreografia, marco teórico, mudança cultural, a posição da Igreja Católica, Marabaixo no Laguinho, Mazagão Velho e Curiaú, manipulação do Estado sobre o Folclore, estilização, etc.
"O Tema escolhido tem por finalidade estudar o folclore negro do Amapá (marabaixo) e suas relações sócio-culturais nas comunidades onde ele é manifestado" 
(Fernando Canto)
  


"Modernidade e Marabaixo - Luzes e Sombras na Perspectiva do Projeto  Rumo ao Novo Milênio"  

Breve Ensaio do Padre Aldenor Benjamim dos Santos (42 páginas) de cunho histórico-pastoral sobre as raízes da religiosidade e identidade cultural.

"Assumo como proposição final mostrar que é possível viver uma relação não conflitiva entre a Igreja e o Marabaixo; e descobrir dentro do marabaixo pegadas da Semente do Verbo que podem ser transformadas em conteúdo teológico, litúrgico, pastoral e catequético".  
(Pe. Aldenor B. dos Santos)


"Maracima, Marabaixo: De ladrão em ladrão a saga de uma nação"
Livro de Nilson Montoril publicado em 2004. São 73 páginas. A obra representa um estudo para o enredo apresentado pela Escola de Samba Boêmios do Laguinho, em 1997. Faz um passeio na vida amapaense, principalmente no que se refere a história do negro nesta terra amazônida. Encontramos capítulos como: o negro no Brasil, importância, o negro na Amazônia, no Amapá, influência no folclore, etc.
O Marabaixo tem seu destaque com a apresentação bem detalhada do calendário, fatos históricos e personagens.


"Marabaixo, dança afrodescendente: significando a identidade étnica do negro amapaense"
No livro a autora, Piedade Lino Videira, chama de dança afro todas que têm expressões africanas e afrodescendentes, realizadas principalmente em comunidades de maioria afrodescendentes. O marabaixo - dança dramático-religiosa de cortejo afrodescendente - está inserido na definição de dança afro por representar a história e a cultura do afroamapaense. A autora buscou (pelo viés da vivência histórica, social e cultural) os elementos constitutivos de sua trajetória e suas construções sociais, políticas e identitárias, utilizando-se de suas narrativas e das próprias observações e análises. São 285 páginas. 
(Texto: editora.ufc.br)



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quinta-feira, 3 de maio de 2012

"Destinados a mim - O carteiro é o poeta" (Izaias José Cruz Cunha)

Leitura sugerida.
No dia 27/04/2012 tivemos o lançamento de mais um livro em Macapá: Destinados a mim - o carteiro é o poeta. Obra com a sensibilidade e simplicidade de Izaias Cunha, poeta paraense radicado na cidade de Porto Grande, onde trabalha como carteiro. Prestativo, carismático e bem humorado, está sempre em contato com a população que o tem em elevada consideração e apreço.
Esta é sua primeira publicação, composta de 65 poemas. Um sonho que se realiza, fruto das inspirações de um menino que, aos 12 anos, fez seus primeiros versos e hoje, como mensageiro aos corações, traz nestes versos belas cores sobre amor, paz, esperança, fé em Cristo, relexões e imagens desta terra amapaense (sua morada há 17 anos).


"Izaias Cunha, nesta coletânea de poesias, nos faz rever nossa missão de não ser pedra para o irmão. Através de seus versos nos ajuda a ficarmos atentos para que não esqueçamos que estamos neste mundo, mas que não somos do mundo." 
(Edson F. Santos)

"Um beija-flor que leva no seu bico de pena respingos de poesia." 

"Para onde é que vão os versos
que às vezes passam por mim
como pássaros libertos?"
(Cecília Meireles - inspiração para o livro)

 
"A poesia está no ar!"
"As palavras foram pássaros em minha vida 
e alguns eu capturei e estão neste livro".

O lançamento foi no SESC-Centro em um evento chamado SARAU de OUTONO, com apresentações musicais e muita poesia. Veja aí imagens do dia:

Imagens do evento - Edição: R. Castelo

... Do carteiro Izaias Cunha a todos os corações:

Pomba

Quero que apague o primeiro "B" da palavra bomba
E se acrescente um "P" de um bom tamanho,
Para ter fim as guerras e ver voar a pomba
Inonfesiva esfacelar este monstro de Urânio.

Este monstro que se voa, pousa e mata
Aponta a nosso mundo e a todos mira,
Que se voar lança de si fedor de morte
- Urânio não só explode, também mutila quem respira.

Quero que troquem esta bomba por pomba
Que se voa, pousa encanta e outro tanto.
Não quero lágrimas, morte e nem dor...

Quero esta paz, este branco, este canto
Quero estef ruto  do Espírito,
Quero este Santo Amor. 

Eu, Bartimeu?

Será?
Será mesmo?
Que o céu não é de bronze
E que o silêncio de Deus
Frente ao meu grito
É provação?

Tudo bem!
Tudo bem mesmo!

Clama Bartimeu, não te importa.
Não liga, pede.
Não, não pára não...
Que Ele já te ouviu e sabe o que precisas.
E se pergunta?
É porque quer ser solicitado.

Clama Bartimeu!
Clamo também eu.

HIPÓCRITA

Faz-me um só favor
Deixe de ser assim, 
Pare de me amar
Sem ter amor por mim.

Grito em Dó

Este poema é um grito
Este grito é uma dor
Esta dor é uma falta
Uma falta de amor.

Esta falta não é mais que aquela
Dor de sempre que tenho sofrido
Esta dor é de fome, e martela
Meu viver que é assim tão sofrido.

Corro e pulo, canto e choro
Visto nada, sonho muito
Durmo um pouco pra entender.

Quando acordo ele é muito maior
Peço então que de mim tenha dó
Que ela; não dá pra esquecer.


O livro de Izaias Cunha pode ser encontrado 
em bancas de revistas e livrarias em Macapá.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Imagens da Praça Floriano Peixoto no Dia do Trabalho em Macapá (2012)

No Dia do Trabalhador, uma diversificada programação na Praça Floriano Peixoto em Macapá (das 8h às 17h). Veja aí algumas imagens.
 A rapaziada foi em peso para a pescaria na praça. Programa de família.
Anunciaram 4 toneladas de peixe no lago. Será conversa de pescador? Vi a maior parte do povo "pegando" mais sol na cara que qualquer outra coisa. Também!!! Por maior que fosse a boa vontade, as condições não se alinhavam para uma boa pescaria, não com a movimentação intensa e poluição sonora.  Quando alguém "puxava" um tambaqui era uma algazarra só e uma vaia danada quando algum azarado trazia na linha  algum pedaço de pau ou outra coisa qualquer. Vi um indivíduo puxar um pneu...e toma-te vaia!!! Essa moçada tava curtindo muito a gozação.
Não deixou de ser uma boa alternativa para sair da rotina no feriado.
Além da pescaria, ocorreram serviços assistenciais como: retirada de documentação, verificação e orientação sobre pressão arterial, massagens, corte de cabelo, corrida do trabalhador, entre outros. 
Ah! Esse povo eu já conheço. Informaram-me que - poxa, finalmente - o caminhão da leitura estará este mês no Bairro do Trem, nas proximidades da Praça da Conceição. Vou ainda confirmar, mas entendi que será no dia 09 0u 10. Taí uma boa oportunidade de acesso à leitura. O BIBLIOSESC tem sempre ótimos livros, que podem ser emprestados mediante cadastro. 
 "A leitura é para o intelecto o que o exercício é para o corpo."
Joseph Addson
Feira de artesanato. Já tinha visto obras semelhantes a estas lá na Casa do Artesão. É um alto relevo em madeira muito bacana. Conheci também o artesão. A quem interessar o nome do cidadão é Magno e pode ser contactado em:
E-mail: magnoartesao-ap@hotmail.com
Contato: (96) 9136-6928

Mais artesanato na praça.
 A garotada teve também suas opções.
Uma coisa interessante e boa foi o posto montado pelo SINE, que recebeu pessoas em busca de emprego, algumas foram encaminhadas.
Mais imagens da Praça Floriano Peixoto, um dos poucos logradouros, atualmente, com alguma beleza em Macapá. A maioria está em condições precárias e em abandono, começando pelas ruas (todas em péssimas condições).
O evento teve também atrações musicais, como a cantora Suellem Braga.
E assim foi o evento na Praça Floriano Peixoto no Dia do Trabalho, em 2012.