"A literatura é a expressão da sociedade,
assim como a palavra é a expressão do homem."
(Louis Bonald)
(Louis Bonald)
Preciso dizer também que não sou partidário de ninguém, sou um leitor interessado em conhecer o que por aqui construíram em nossa literatura amapaense.
Os livros que dei uma espiada foram: "O Guerreiro Tucujus: Espírito do Passado" e "O Vento dos Açaizais" (romances) ambos de Carlos A. Sampaio Cantuária (que lembrei posteriormente ser também um político aqui).
"O Guerreiro Tucujus: Espírito do Passado" é um romance regional, publicado em 1989, ambientado no Amapá dos idos coloniais. Conta-nos a história de Laureano e Pérola, casal vindo das ilhas do Pará para firmar moradia nestas bandas. Aqui vão conhecendo a terra, costumes, lendas e a natureza. Destaque também para Antonio Tucujus, amigo do casal, que faz um papel de anfitrião apresentando os saberes locais, como o batuque, quilombo, natureza e a lenda da negra montada no jacaré. A história não é linear e nem de trama aprofundada. Tal qual um romance naturalista, a terra com suas peculiaridades é o centro de tudo. Às vezes o autor foca o cenário natural, mais adiante a fuga de um escravo para o quilombo e até uma batalha no Arraial de Santana, sempre com ênfase aos defensores da terra. Relevantes também são os poemas intercalados entre as narrativas - suspiros poéticos do indígena, do escravo, etc. A obra encerra com um suposto rapto de um dos filhos do casal por aquela figura lendária mencionada. Nas entrelinhas percebermos, acima de tudo, uma homenagem aos formadores desta terra: o índio, o negro e os migrantes (caboclos vindos das ilhas paraenses). Personagens com seu valor, suas dificuldades e suas crenças nessas terras outrora habitadas pela extinta e valente nação indígena Tucujus.
Veja alguns fragmentos do livro, para ilustrar o que mencionei anteriormente:
"Águas barrentas, um infinito horizonte esverdeado. Os passageiros da pequena embarcação manifestavam uma imensa alegria depois de vários dias navegando pelo caudaloso e magestoso rio de águas escuras e barrentas. O Amazonas, que esconde milhares de segredos jamais descobertos e mistificados pelas lendas centenárias"
"O Tucujus falava ao casal, dos encantos da Vila como fosse seu construtor, contando detalhes importantíssimos do povoamento."
"Canto. Meu grito de dor.
Sou a imagem de um povo sofrido.
Lágrimas de meu passado,
Sonhos sem futuro.
Nação próspera e feliz.
Vi - vi meu povo ser dizimado.
Estampidos, lâminas, gritos... escravidão.
Morte - morte que vi.
Hoje sozinho, agarrado no meu passado,
Canto meu grito de dor."
"Gemendo me encontro.
Relembro o meu passado.
Dores no corpo de meu trabalho escravo.
Canto saudades de minha juventude não vivida.
Sinto um peso que carrego.
É o meu próprio corpo.
Cansado, disforme e velho.
Nesta minha velhice desamparada.
As lamúrias suplicantes de meu ser manifestam-se.
Pois sou negro escravo,
Única coisa que sei e questiono,
Onde andará meu Deus."
"Correndo para o local onde os cães permaneciam latindo, viu os rastos do imenso jacaré e as pegadas da Negra Lana..."
O livro tem ilustrações de André Cantuária, é de linguagem e textos simplificados e apresenta um total de 117 páginas (o formato é pequeno e pode ser lido em poucos minutos).
"O Vento dos Açaizais" é mais uma obra de valorização regionalista, publicada em 1991 (com 77 páginas). A narrativa foca o enterro de um ribeirinho do rio Flexal. Basicamente, mostra a estória de um grupo de amigos e compadres ribeirinhos no funeral de um dos seus. Mas estamos falando da Amazônia, de suas peculiaridades, por isso o cenário mostra boto, o rio, suas particularidades e até o encontro com um grande sucuriju (descrito com o entusiasmo e exageros comuns do amazônida). Poderia se apresentar como um grande causo. O malfadado defunto se vê envolvido em confusões cômicas, com direito a despencar no assoalho da casa, ser transportado por canoa no cortejo fúnebre e chegar a uma situação de pensarem que estivesse vivo. Seria cômico se essa Amazônia, o centro das atenções nestes dois romances, não fosse o principal agente de tudo, levando o defunto para moradia final no fundo do rio, através de uma grande pororoca. É a terra o elemento mais importante, determinando e influenciando o rumo de tudo... seja natural, seja humano. O ribeirinho, com todas as suas peculiaridades, é mais um elemento neste cenário natural. Se o pobre defunto estava à mercê de seus camaradas para seu destino final, todos ali estavam à mercê de uma força maior - a Amazônia - que dá o desfecho, deixando todos no meio de uma pororoca e nas consequências de um grande alagamento. Afinal, quem conduz quem?
Destaque para um garoto, a descrição de um perfeito moleque enjoado, em determinado momento da estória. Iguais a este têm um monte... sem ser na literatura. Julgue comigo se não tenho razão. Olha aí o pentelho em ação:
Um moleque querendo ver o morto se expremia entre os presentes, empurrando um e outro para chegar ao caixão.
- Dá termo moleque! Vê onde pegas, não te ensinaram bons modos?
O moleque não deu ouvido e logo chegou ao caixão e pôs-se a olhar curiosamente o defunto.
- Fummmmmm... Tá fedendo! Falou alto o moleque.
- Te aquieta, moleque danado!
O moleque continuou a observar. De repente outro grito chocalhado e um movimento na braguilha do morto; o moleque observava o movimento e aponta na direção da braguilha do defunto, que volta a mexer-se, entoando novo grito.
- A calça está se mexendo! Diz o moleque já assustado.
- Eu vi também!
- Olha lá! ...continua se mexendo!
Um empurra-empurra, era caboclo rebolando um por cima do outro que acabaram derrubando o defunto, que caiu fora do caixão de peito para cima.
- Ó minha Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, olhai para este homem!
O defunto exala um cheiro desagradável pelo ambiente, fazendo muita gente sentir náuseas, mas não se afastavam. O mal cheiro e o movimento da braguilha indicava que algo de anormal estava acontecendo. O morto foi rodeado, o moleque novamente com sua curiosidade ajoelha-se para observar. A caboclada estica o pescoço para olhar com bastante atenção. Um coachar característico e um movimento...
- Tá se mexendo! ... Tá se mexendo! O saco do homem tá se mexendo! Grita apontando o moleque.
As pessoas que estavam na frente eram empurradas prá cima do defunto pelas pessoas detrás, que queriam observar melhor; ao mesmo tempo as da frente forcejavam para não cair em cima do defunto.
- Vejam! Tá saindo algo da braguilha do homem!
- O que será aquilo?
- Não! ... Não pode ser!
- Mas ele já está fedendo!
Novamente o moleque grita:
- É um sapo! É um sapo!
Toda a caboclada cai na gargalhada deixando extravasar no riso o medo; até Dona Matilde não se conteve e riu à vontade.
- Eu não acredito! Justifica o velho Sabá rindo com Pedro.
O sapo salta prá cima das pessoas que empurram umas às outras, deixando o sapo sair da casa. A reza parou depois do susto, pois os ventos ameaçadores continuavam a descobrir casas e derrubá-las.
O caixão era recolocado sobre a mesa e o defunto novamente acomodado. Desta vez sendo recoberto por um lençol de renda.
(Trecho do capítulo "Curiosidade", do romance ""O Vento dos Açaizais" - Carlos Cantuária)
Umas palavras sobre o autor:
Carlos Alberto Sampaio Cantuária e mazaganense, estreou como
escritor publicando o livro PRÁTICA DOS MOVIMENTOS POPULARES, SUAS
LUTAS DIREITOS E DEVERES (1987), está entre os romancistas pioneiros na Literatura Amapaense e recebeu da
crítica o reconhecimento e notoriedade de escritor com o romance O GUERREIRO TUCUJUS: ESPÍRITO DO PASSADO (1989).
TAÍ MEU MANO!!!
Duas sugestões sobre a Literatura no Amapá. São obras de fácil compreensão, muito adequadas às escolas e jovens leitores, com teor bem interessante e que podem ser lidas, cada uma delas, de uma tacada só em uma boa baladeira!!!
VALORIZE, PRESTIGIE E CONHEÇA A LITERATURA AMAPAENSE.
CASO INTERESSE, ESTAS DUAS OBRAS ESTÃO NO ACERVO DA
E ESTÃO À DISPOSIÇÃO PARA SUA CONSULTA.
UUUhh cabucu!!! Vamu ispiar e dicubrir utras cuisa!!! Falúúú´!!!