As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

"Poraquês e Piaçocas" - J. Jovino

"A literatura é um assunto sério para um país, 
pois é afinal de contas o seu rosto."
(Louis Aragon)

Beleza! Aproveitei mais um final de semana para conhecer algo mais da Literatura Amapaense. O que conheci divido aqui e deixo como sugestão de leitura.

Leitura sugerida.
"Poraquês e Piaçocas" - Obra de J. Jovino, publicada em 1998 sobre um migrante em Macapá. O autor, filho adotivo das terras amapaenses, misturando ficção com recordações pessoais, nos conta a história de José Amâncio. Trabalhador, mineiro, vindo a esta terra em busca de oportunidades e aperfeiçoamento profissional, por ocasião de curso no SENAI. A narrativa começa em 1989 e termina no final dos anos 90. Como é comum à grande população brasileira, não conhecia verdadeiramente a vida na Amazônia, seus costumes e convivência com esta natureza tão presente, principalmente no Amapá. O texto é expressivo e atento às coisas locais, tornando este seu ponto principal. Apesar de obra fictícia, no relato e impressões do autor, vemos uma Macapá se descortinando, mostrando algumas de suas particularidades, escritas com o entusiasmo da descoberta. O título já evidencia isso, remete-se a animais que o autor, notadamente um ecologista, descobriu aqui  na cidade em convivência com a população (poraquê deves conhecer, já a piaçoca refere-se a jaçanã). Ao mesmo tempo nos faz perceber as transformações sempre presentes e constantes na cidade, pois o autor, mesmo com pouco tempo na terra, vai relatando  o desaparecimento das primeiras impressões com saudosismo. O José Amâncio é este homem que descobre, relata e nos mostra, como morador, um pouco dos costumes desta terra. Há a descrição da viagem de barco no início da história, da vida mais pacata que vai mudando (Macapá do final dos anos 80 era diferente de hoje) e o saudosismo da terra quando passa um tempo em outro estado. Também compara costumes locais, fala do Bairro São Lázaro (quando morou em área alagada), cita transformações no Araxá, a destruição dos aturiás e a ocupação da região. Vemos ainda uma história envolvendo o garimpo do Lourenço relatando muita da realidade - prostituição e exploração. Por essas e outras é um livro principalmente de homenagens ao Amapá. Ao final de cada capítulo o autor apresenta sempre uma poesia, sobre a mulher, a mãe, a terra, o negro e  o povo.

O Livro é:
Título: Poraquês e Piaçocas
Autor: J. Jovino

Editora: Valcan
Ano: 1998
Páginas: 124 
Tema: Romance / Amapá
Veja aí algumas frases que separei do livro e tire suas conclusões: 

"Trata-se de um romance, nascido espontaneamente no coração, ou seja, um misto de amor, homem e natureza." (Alci de Jesus - Apresentação)

"O livro é uma narrativa, às vezes, feita de forma dissertativa. Fala, em sua quase totalidade, do modo de viver de um forasteiro e também de pessoas que conviveram com ele durante alguns anos." (J. Jovino - Introdução)

"Para José Amâncio tudo era novidade, inclusive o tipo de viagem, que pela primeira vez era de barco."

"A riqueza natural do Amapá é muito grande, mas o Amapá entre sua simplicidade, às vezes, não se dá conta disso."

"Depois de tempo no Amapá Amâncio podia dizer algumas coisas sobre o comportamento dos amapaenses."

"Conhecendo o Amapá é impossível deixar de se encantar com as riquezas encontradas na fauna e na flora, no povo e riquezas minerais."

"Além do marabaixo e do batuque, há outras manifestações preservadas pelos negros e seus descendentes que valem a pena conferir."

"Por outro lado, o estado é rico em lendas, como a cobra grande, do tajá, da mandioca, do açaí, entre outras. Isso tudo torna seu folclore rico e importante."

"O estado tem vocação garimpeira, embora hoje em processo de desativação por causa da exaustão de jazidas."

"Devido  o Bairro São Lázaro ser quase que totalmente alagado e, além disso, povoado de buritis, açaizeiros, tajás e outras plantas, torna-se um ambiente propício para, entre outros, ver-se camaleões, moreias, poraquês, tamuatá, etc."

"Ao observar piaçocas em seu habitat natural surge a preocupação em se conseguir um meio de tentar salvá-las da extinção."

"Deveria haver uma solução para que nos arredores de nossa capital piaçocas pudessem continuar vivendo e despertando as pessoas com seu canto. Deveria também haver uma maneira de permitir que o peixe elétrico continuasse vivo, com sua curiosa e misteriosa eletricidade."

"Animais como poraquês e moreia são mortos e abandonados no meio da rua."

"Alguns messes se passaram desde a morte da piaçoca e seu cantar não foi mais ouvido".

"Se no São Lázaro camaleão ainda contínua se misturando com as folhas, sucuris em plena atividade procuram alimento, piaçocas criam seus filhotes, isso significa que nem tudo está perdido. Ainda resta uma esperança."

"No garimpo vigoravam duas leis, a do mais forte e do silêncio".

"Às vezes, Amâncio se pergunta até quando os seres humanos irão viver sem prestar atenção ao que ocorre em sua volta. Tem que chegar um dia em que se dê importância ao equilíbrio natural."

"Passaram-se dois anos e já em 1996, voltaram ao araxazinho, agora um pouco diferente, pois onde antes era mato, troncos e areia, agora se viam barzinhos erguidos de maneira precária para comercializar bebidas e tira-gostos junto aos frequentadores."

"A Praia do Aturiá de hoje está muito diferente de alguns anos atrás, fora descoberta como balneário e, além disso, os sem teto estão tentando destruir os aturiás para fazerem suas casas na praia, em cima da areia."

Trecho final da obra

"Quem sabe um dia o ser humano aprenda a conviver com o meio sem agredi-lo, preservando-o para futuras gerações.
Ao relatar a pitoresca viagem de navio de Belém para Macapá, seus encantos e curiosidades, ou ao descrever lugares como a Serra, a Praia do Aturiá, ou ainda quando aconselha homens e mulheres sobre comportamento, ou mesmo quando critica de maneira construtiva o homem amapaense, e ao descrever poraquês e piaçocas, o autor deseja mostrar - principalmente para outros estados do Brasil - a riqueza cultural desse povo amigo e ordeiro, amazônicos, o povo amapaense.
Ao criticar, às vezes, em nenhum momento houve a intenção de menosprezo e sim de chamar a atenção para pontos positivos. Espera-se que este trabalho possa ser útil como incentivo ao turismo, principalmente o ecológico, nesse lindo pedaço e início do Brasil." (J. Jovino)

Esta é a obra de J. Jovino. Interessante e assumindo, até certo ponto, ares históricos pela descrição da cidade. Seria importante que fosse mais conhecida nas escolas, quem sabe uma nova edição... Tenho que falar também, apesar de não ser a pessoa ideal para isso, que esta obra, como uma pedra preciosa que precisa de lapidação, precisa também de uma boa revisão gramatical.
A obra apresenta também uma poesia na maioria dos capítulos. O literato amapaense Alci de Jesus refere-se a elas da seguinte forma: "Poraquês e piaçocas, fruto da intelectualidade amadurecida ao longo dos anos, mostra o lado bonito e romântico de nossa terra, e suas poesias, o lado carinhoso do homem com relação à vida." Uma delas está a seguir.

Canção do forasteiro

Não vai longe o dia
Que triste aqui chegava
Trazendo na alma dor
E no coração calor e sede
de afeto, carinho e amor.
Amor pelo verde das matas
Calor pela água do rio
Morena me enrolou em seus cachos
Curiaú, Fazendinha, Aturiá, Marabaixo.

Vi a Serra com seu verde frio
Mazagão, sua feita, seu rio
Zagury, quebra-mar, sua brisa, seu cio.

Fortaleza, imponência e beleza
Marco, início, história, força e heroísmo
Mas também dor e sofrimento
Luta, proteção e patriotismo.

Ricos, riqueza, ouro e terras
Muito verde, natureza, poucas guerras
Negras, morenas, louras e caboclas
De encher os olhos e sonhar por elas
Vi você Amapá
Rico, porém, sem assoberbar-se
Início de Brasil, pulmão do mundo
Simples, sem se humilhar.
(J. Jovino)
Marabaixo (Obra do artista amapaense Dekko, que o autor mostra no livro)
Foto: carlamarinhoartes.blogspot.com.br 
É meu mano!!! Tai mais uma obra desta nossa Literatura no Amapá. Este livro eu tomei emprestado da Biblioteca SESC-Centro e está a disposição lá para os que queiram ler. 
Valorize nossa cultura!!!
Conheça nossas bibliotecas em Macapá!!!