As bibliotecas sempre reservam surpresas e descobertas. Tenho isso em mente como visitante fiel e também como estímulo para as buscas.
Uma das coisas que encontrei, já faz um bom tempo e resolvi agora compartilhar, foi o romance NIRANAÊ, de Edgar Rodrigues, publicado no ano de 1997, em Macapá. O principal motivador da leitura foi o caráter indianista, com uma visão dos primeiros
contatos com o colonizador europeu. Os índigenas
mostrados são os Tucujus e o europeu protagonista é o espanhol Mário
Hernandez. É ainda uma das poucas obras neste segmento na literatura local, ao lado de O GUERREIRO TUCUJUS, de C. Cantuária (1989).
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Vicente Pinzón
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O autor usou um fato histórico, também controverso, no início do
romance, que foi a passagem do navegador espanhol Vicente Pinzón pela
costa do Amapá em 1500, antes de Cabral oficialmente descobrir o
Brasil.
Pinzón fez parte da expedição de Colombo, capitaneando a nau Niña, e a ele é atribuída a denominação Costa Palicúria, a primeira
referência às terras amapaenses - nome inspirado na presença dos índios
Palicur na região. A passagem pelo Amapá e designação da região é causa de discordâncias entre os historiadores, mas o fato serviu
de inspiração com a referência de um naufrágio nessa expedição, resultando no resgate do tripulante Mário Hernandez por Itanhaê, pajé
na nação Tucuju. Mário é salvo de ser devorado por jacarés, levado
para a tribo e, de uma paixão repentina por Niranaê, a bela filha do
líder e guerreiro Itaraê, constitui uma miscigenada família, tendo os
filhos Hernan, Amália, Luzia, Jacareí e Aracém. Essas são as personagens
no romance.
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Indígena (Obra de Xavier, 2012) |
Li nas versões impressa e disponibilizada em um blog. Tive
algumas impressões e a primeira delas refere-se ao ritmo com que a
história é apresentada. A passagem do tempo é um pouco acelerada e o
autor não se detém em muitos detalhes nisso, deixando certos fatos
cercados de mistérios, como o naufrágio no início. Nesse sentido, parece
uma obra naturalista, com uma abordagem geral dos primeiros contatos, mostrando histórias verossímeis ou não, bonitas ou chocantes.
Outro aspecto que notei refere-se às características do indígena. O
autor optou por um caminho menos idealizado frente aos escritos
indianistas, pois o romance passa uma sensação de ingenuidade e fragilidade do
índio, tanto em seu ambiente natural quanto em relação aos
colonizadores. Tratando-se da lendária tribo Tucuju, cantada em versos e
prosa nestas terras, transparece uma imagem de subserviência, convergindo tudo (liderança,
cultura e valorização) para a dominância dos colonizadores. Meu
conhecimento de apego popular gostaria de ter admirado mais
façanhas e brio deste povo sem a presença do europeu.
Natureza na arte de Cláudia Cabral
No meio ambiente são mostrados alguns fatos dramáticos, onde a natureza apresenta-se com uma realidade selvagem e indomável, de certa maneira é uma valorização da terra. Lugar para os fortes. O índio testemunha isso em sua vivência e o destino de Luzia que o diga.
A história exprime modernidade em determinados pontos, seja
no linguajar ou sucessão de fatos, e é dessa forma que o autor conclui, em uma visão bonita e idílica, ideologicamente também muito otimista e
progressista para os idos de 1500. Ô inveja para o
Peri...
É uma obra valorosa, principalmente pelo ineditismo na literatura local, e
a leitura foi uma interessante viagem por idos que sonho e até então
nunca havia palpado.
Título: Niranaê
Autor: Edgar Rodrigues
Editora: O Dia
Ano: 1997
Páginas: 110
Tema: Romance indianista / Amapá
No Dia Nacional do Livro fica aí a sugestão.
Para conhecer o autor e o romance na íntegra veja o blog