As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

segunda-feira, 14 de março de 2016

Na boca do jacaré-açu (Ray Cunha)

Catorze contos amazônicos ambientados no Pará, publicados em 2013 pelo amapaense Ray Cunha. Há lirismo em O desabrochar das rosas e um sarcasmo em Memorial dos gatos. No geral, as histórias mostram uma busca existencial canalizada ao imediatismo dos prazeres. 
O autor cita Ernest Hemingway em dois momentos, numa referência ao suicídio paralelo a intensidade de vida e melancolia. Pode ser que esses aspectos tenham dado alguma inspiração a essa obra, pois é o que vemos na maioria dos contos, principalmente no que deu nome ao livro.


Título: Na Boca do Jacaré-Açu – A Amazônia como ela é
Autor: Ray Cunha
Editora: Ler Editora 

Ano: 2013
Páginas: 154
ISBN: 978-85-64898-45-5
Tema: Pará / Contos 

Na boca do jacaré-açú, referência a desembocadura do Amazonas, tem como protagonista Agostinho, um arqueólogo paraense, bem estabelecido financeiramente, que aparenta ter frustração na vida. Começam aí os paralelos entre melancolia e ardor nos prazeres como via de escape. 
O conto se desenrola com passagens pela Ilha de Marajó, que tem a natureza apresentada de maneira selvagem, do tamanho da vanglória do caçador, expressa em sucuri de 12 metros, no melhor estilo Titanoboa, puxando búfalo para o rio, cheio jacarés tipo Sarcosuchus, em matas onde as onças não transmitem outra coisa que não seja a imagem de uma besta fera. Enfim, é um cenário onde o personagem torna-se caçador, justiceiro, e tem buscas românticas, deixando em paralelo sua vida melancólica ante a exuberância amazônica. Percebemos dramas pessoais e familiares, onde a figura do pai tem também uma história traumática e impactante em sua vida. O arqueólogo tem essa disposição de conflitos internos, potencializados pelo vazio de Deus em sua mentalidade. A história avança até o mais trágico desfecho aos corações melancólicos. É o que parece sugerir, com sua disposição fatalista, de se entregar e se deixar tragar.  
A leitura foi envolvente enquanto narrativa. Ressalte-se também que o conto faz parte de uma história abordada em outras obras como  O lugar errado (de 1996). 
Conheça, viaje, posicione-se, concorde, discorde, opine sobre as leituras...

Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 

Macapá - Bairro Central

quinta-feira, 10 de março de 2016

A Revolução (Banda Catedral)



A Revolução
(Banda Catedral)

Vamos acabar com a hipocrisia
E aprender a dividir o pão
Viver com a verdade sem mentiras
Se resolver e esquecer a solidão
Varrer as ruas de toda maldade
Sonhar a cada instante
Esquecer a realidade
Construiremos uma nova realidade
Com igualdade e liberdade
Não vamos construir mais templos ricos
Deixar as crianças morrerem de fome
Se preocupar com o ouro e granito
Enquanto o mais próximo não come
O maior pecado cometemos todo o dia
O da inconveniência e da indecência
De fazer nada vezes nada...

Vamos decretar a revolução

E vamos dar terra a quem precisa
Sem se enganar com quem explora
A ideia da terra pela ideia do poder
A ideia da terra para alguém se eleger
Nos aposentaremos aos sessenta
Pois com cinquenta seremos vagabundos
Vagabundos no batente desde os quinze
Num país que é nossa pátria mãe gentil
Viva os deputados do congresso
E a exploração católica da pobreza
Viva a utopia mãe gentil
Viva o Brasil

A revolução da palavra
Pela palavra de Deus
A revolução do amor ao próximo
E do amor a Deus acima de todas as coisas.

Essa música faz parte do álbum A Revolução, lançado pela banda Catedral em 1998 no meio gospel. É o nono em sua trajetória, marcada pela abordagem a temas sociais,  e o que teve maior sucesso. Destaque para o virtuosismo do guitarrista Cézar, falecido em 2003. A letra faz uma crítica com ironia e ressalta a mensagem do evangelho no final. Legal!

quarta-feira, 9 de março de 2016

Cabanagem - A Revolução Popular da Amazônia (Pasquale Di Paolo)

Salve, galera esperta! Poxa, dei uma conferida em mais uma publicação da nossa biblioteca em Macapá e curti demais. Invariavelmente, viajei muito e gostaria de compartilhar. Claro, lembrando que são simples observações de um leitor, para teres uma visão da obra e, quem sabe, embarcar nessa viagem também. Saca só qual é a desse livro...

Essa obra foi premiada em 1985 com o primeiro lugar em um concurso nacional de monografias, promovido pelo Conselho Estadual de Cultura do Pará, por ocasião dos 150 anos da Cabanagem. Pasquale Di Paolo, o autor, é sociólogo e professor da UFPA (na ocasião). A abordagem traz um olhar sobre a Cabanagem (em suas origens, ideais e consequências) valorizando-a como revolução. Esse é o pensamento chave e a inspiração. Assunto de divergências históricas e, principalmente, até a publicação desse livro, sem ainda um registro valoroso e detalhado nessa concepção. Para melhor compreensão das pretensões, basta fazer um paralelo entre a principal obra historiográfica do tema e a proposta do livro.

Domingos Raiol tem a visão de motins ou rebeliões (como se registra no título de sua obra, "Motins Políticos") enquanto Pasquale Di Paolo propõem a revolução nortista (enunciado no subtítulo do livro, "A Revolução Popular da Amazônia"). O que influencia as diferentes percepções é a estruturação política e cultural.
Raiol enfatiza que isso foi determinante na derrota dos cabanos (o que está correto), porém, pela falta do suporte cultural, político e governamental, limita a percepção da Cabanagem essencialmente a revoltas armadas, de insatisfação, que não chegou a se torna revolução (algo que tivesse um projeto político unificado).
Pasquale traz a proposição revolucionária que unificou a Amazônia em um ideal libertário e, mesmo que tenha sido derrotada, se projetou e deixou raízes que viriam a influenciar a ideologia no império e História do Brasil.

Para chegar a essa valorização o autor considerou alguns aspectos. O primeiro é a inserção da revolução no cenário internacional, nacional e regional. A Cabanagem respondia a uma ideologia que acompanhava todos esses contextos. 

Em linhas gerais, no aspecto internacional, podemos citar a Revolução Francesa (1789), a independência dos EUA (1776) e os movimentos libertários nas Américas e Europa (como na Argentina em 1776 e na Grécia em 1822). No aspecto nacional, ocorreram muitas lutas que fervilharam no país (como a Revolução Pernambucana em 1824). Regionalmente, tem destaque a adesão do Pará ao separatismo (que havia gerado episódios que ficaram incutidos na determinação e inspiração cabana, como o massacre do brigue Palhaço em 1823), a questão indígena agravada com a expulsão dos jesuítas, e a cultura favorável à república e abolição da escravatura. Todos movimentos de lutas revolucionárias contra um conservadorismo e absolutismo resistentes. A Cabanagem tinha essa conotação, entre outras coisas.

Em seu desenvolvimento vemos: luta política, luta social e luta de resistência. Ressaltando-se o separatismo na questão política, a cidadania na questão social e a luta de resistência contra as forças legalistas. Pela soma disso tudo, e outras coisas que o autor aborda, está caracterizada uma revolução.

O autor disserta também sobre a visão elitista sobre o movimento, que contribuiu para esvazia-la de suas características e fragmentá-la a um ponto de rebeliões (ou motins, segundo Raiol), com uma ideologia de desvalorização. A concepção de Pasquale é popular, valorizando a consciência e disposição do povo para mudanças.

O livro é rico em histórias e orquestrações políticas que, para um leigo como eu, trouxeram curiosidades e descobertas. As mais relevantes falam das causas da derrota dos cabanos que, na minha ignorância histórica (mas de grande vontade de descobertas) ficou marcada por personagens que associei a derrocada, como o padre Prudêncio Tavares e o general legalista Francisco Soares Andréa

Dois personagens representativos de ideologias que influenciaram na derrota dos cabanos.

O primeiro, para mim, simboliza a resistência anti-cabana que o clero teve. Ele atuava em Cametá e exerceu forte influência a não adesão da população ao movimento (até com combates que derrotaram e mataram mais de cem cabanos). Transfigura-se nisso a oposição do clero à Cabanagem, que foi decisivo pela ausência do suporte intelectual ao novo governo. Outros sacerdotes tinham essa mesma visão, como em Abaeté e Vigia.
O segundo, o general, mostrou a postura legalista para derrota dos cabanos. O caminho foi terrível e genocida, vendo-se a formação de tropas com o livre-arbítrio para execuções, contando com mercenários contratados, com julgamento marcial severo imposto para todos de 15 anos para cima, estabelecendo isolamento de Belém, tendo a associação com o clero interesseiro contra os revolucionários e a ideologia elitista disseminada sobre o movimento. Segundo o autor, houve até estímulos de visão racista.
 

Entre os episódios descritos, foi interessante ler sobre os massacres em Vigia e do brigue Palhaço, além do plano de vingança do padre Prudêncio por conta da morte de alguns padres em retirada da região.  
São impressões sobre a obra, que tem muitos outros aspectos para se descobrir. No final o autor realça os ideais libertários dos cabanos que, embora derrotados, influenciaram a história subsequente. O último navio-negreiro a aportar em Belém, por exemplo, foi um ano antes da Cabanagem. Essa não foi uma luta de selvagens vindos das cabanas (olhar elitista), mas de valorosos brasileiros em busca de seus direitos (revolucionários enquanto povo marginalizado).

Título: Cabanagem: A Revolução Popular da Amazônia
Autor: Pasquale Di Paolo
Editora: Conselho Estadual de Cultura do Pará

Ano: 1985
Páginas: 416
Tema: Pará / História / Cabanagem

 


Algo que foge do contexto do livro é que gostaria de encontrar uma obra que fosse mas atenta e detalhada na descrição do povo (similar ao que Euclides da Cunha fez em "Os Sertões" sobre os sertanejos). Será que tem alguma desse jeito? Será que as centenárias obras de Raiol trazem isso? Não sei, mas quero conhecer muito mais dessa valorosa história. 
 
Gostei e viajei muito, equivocado ou não, mas tentando entender. E te convido para essa aventura no saber também. Já sabe sumano, a obra está disponível na
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 

Macapá - Bairro Central

sexta-feira, 4 de março de 2016

Curiaú, a marca de uma geração (Sebastião Menezes da Silva)

O Curiaú é uma região de relevância histórica, cultural e ambiental em Macapá, sendo tema recorrente de pesquisas. Sebastião Menezes é um dos maiores estudiosos do tema, principalmente por ter origens no lugar, com uma importante contribuição no resgate do cotidiano e tradições. Valores que se repetem em seu mais recente livro, o terceiro, publicado em 2015 e direcionado ao público infantojuvenil. Conheça um pouco nos seguintes relatos...

Esta obra foi escrita por Sebastião Menezes e retrata a história das crianças e adolescentes do Quilombo do Curiaú, perpassando por suas brincadeiras, os tempos escolares e os fatos curiosos que aconteceram naquele lugarejo antes de todo o progresso dos dias atuais.
O objetivo principal deste trabalho, no entendimento do autor, é registrar de forma simples e original, fatos ou acontecimentos que marcaram a trajetória de vida do povo negro que habitou a nossa comunidade, para que no presente, assim como no futuro, possamos ter conhecimento e revivê-los.
 
(Rosa Ramos - Apresentação)

Ilustração do texto A semana da Pátria, 
sobre os desfiles cívicos (Desenho de M. Silva)
Estas histórias foram baseadas em fatos reais de nossa comunidade (Curiaú), fatos que foram presenciados, vividos e ouvidos de crianças e pré-adolescente.
As histórias, cada uma delas, possuem personagens, hoje adultos, que talvez nem lembrem do acontecido, mas vieram do Curiaú e a maioria ainda está viva.
Entre o Curiaú do passado e o Curiaú do presente existe uma grande mudança em relação a tudo. As crianças possuem um jeito, maneiras, hábitos, estilos e atitudes diferentes. Isto acontece de acordo com as mudanças dos tempos.
Os personagens que deram origem para estes textos não tiveram seus nomes expostos, mas com certeza alguém deduzirá de de quem se trata e eles deverão ser respeitados e homenageados, pois também fazem parte da história viva da Comunidade do Quilombo do Curiaú.
(Sebastião Menezes - Dedicatória)
Ilustração de "A História na vida infantil no Curiaú", 
 texto nostálgico (Desenho de M. Silva)

Relatos do cotidiano infantil na comunidade quilombola do Curiaú, resgatados por Sebastião Menezes de suas pesquisas e observações.
As histórias são pitorescas e trazem a percepção da identidade local, caracterizada pela forte interação com a natureza e tradições. Elementos como o rio, os animais, a agricultura, a pesca, o folclore e a vida estudantil na Escola José Bonifácio são recorrentes. Os relatos são sucintos, não passam de uma página, trazem ilustrações de M. Silva (artista plástico da localidade) e em geral tem um direcionamento educativo.
Os textos são descritivos e a abordagem não é específica a alguma personagem. As crianças no geral tem esse foco, em histórias reais e típicas.
Admiro o autor na valorização de sua comunidade e fiquei com a impressão de que a maioria dos relatos remetem-se à sua infância, pois elementos da modernidade (sucesso entre a criançada) não se fazem presentes, destacando-se as tradições. Isso é explícito no texto O que existia no Curiaú, que tem a exposição de saberes ultrapassados ou talvez em desuso (como o costume do almoço servido aos cachorros na festa de São Lázaro) e a mentalidade recorrente sobre a necessidade das crianças "pegarem" algumas doenças para crescerem mais fortes (esquisito isso, mas presente em outros tempos).
A leitura foi interessante e, se é pra opinar,  senti falta de elementos como o Marabaixo (algo tão característico quando pensamos no local) e daquelas histórias folclóricas contadas pelos veteranos (como os avós, tios, pais, etc e tal). Isso vem em minhas lembranças sobre a infância e, em uma obra de resgate cultural, bem que poderia ser algo valorizado também. Acredito que o Sabá deva ter ótimas e saborosas histórias assim, que enriqueceriam mais o livro (Ah, fica a ressalva de que o aspecto mitológico foi explorado pelo autor em outras obras e essa busca o resgate do cotidiano).
Para as crianças, para tenros leitores, para as escolas, para o Amapá!
(Registro no SKOOB)

Título: Curiaú, a marca de uma geração
Autor: Sebastião Menezes da Silva
Editora: Edição do Autor

Ano: 2015
Páginas: 83
Tema: Literatura Infantojuvenil / Curiaú


Como falei, os textos são curtos, educativos, ilustrados e a obra tem cerca de 60. Separei um deles: A natureza na vida das crianças.

 A obra está disponível na
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 

Macapá - Bairro Central

terça-feira, 1 de março de 2016

Brilho de Fogo e outros Poemas de Amor (Augusto Oliveira)

Falar de poesia é complicado para mim, em geral, por conta do subjetivismo que vemos nas obras, algumas vezes parecendo indecifrável. O que não se observa nesse livro.
A inspiração é muito clara, com uma exaltação à paixão. Sem rodeios, sem contenção aos ardores ou pudores, com uma carnalidade gritante e de coerência à uma realidade experimentada pelos amantes. Vemos uma urgência de satisfação, de entrega total aos jogos do amor, confidenciada em tons de súplica ou como o maior de todos os desejos, personificando uma razão existencial. Os versos são sensuais, com percepções erotizadas, provocativas e intensas nas emoções. Algo disso se deve, talvez, ao momento de inspiração, por ser uma coletânea reunida a partir das percepções de um jovem desde os dezessete anos. Está implícito um viço de descobertas, de fascínio e entusiasmo na experimentação, crescente para a sujeição cativa dos amantes. Divagando um pouco, bem poderiam ser versos de Barbosa à Lenita em A carne, clássico de Júlio Ribeiro, de 1888 (conheces esse romance?).
O título fala "amor", mas prefiro relacionar com a "paixão". No final das contas é disso mesmo que trata. Na percepção que o leitor tem liberdade, foi assim que senti.
 
Ressalte-se que o título faz referência também ao lendário beija-flor brilho de fogo, em um paralelo sugestivo ao belo e precioso na descoberta.
Não sou um entusiasta, mas a leitura tem seus pontos valorosos e interessantes, afinal, um pouco de paixão é sempre instigante. Diz aí se não... 


Título: Brilho de Fogo e outros Poemas de Amor
Autor: Augusto Oliveira
Editora: Scortecci

Ano: 2006
Páginas: 101
Tema: Literatura Amapaense / Poesia

Temas assim despertam tanto entusiasmo (e fazendo por merecer)... Assim, entre as várias apresentações no Prefácio, deixo em registro a de  Antonia Andrade (ah, porque foi minha professora também na UNIFAP).
"O olhar de um poeta revela e desvela nos mínimos aspectos a beleza, a magia e a essência dos sentimentos vividos a cada momento pelos amantes... A divindade da poesia de Augusto Oliveira nos convida a viver esses momentos como se fôssemos os personagens principais. E nos envolve em um mundo de encantos, onde o fascínio dessa viagem confirma, que amar é a gente viver no sentido pleno do seu significado; onde existe um querer que faz sorrir, que faz chorar, que domina, que encanta da forma mais profunda e sensual... Essa é a capacidade do Augusto na sua poesia, e é por isso que a minha admiração por ele é muito grande. Afinal, ele é meu amigo, meu confidente, meu poeta."
A obra reúne mais de 80 poesias. Eis algumas:

querendo dar uma sacada no livro? 
Então te convido para conhecer a 
Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 

Macapá - Bairro Central

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Pássaros Máquinas no Céu do Amapá (Cassilda Barreto)

Viajar na História é algo surpreendente e curioso pelas coisas que vamos descobrindo (ou tentando entender), se perdendo, se encontrando e até mesmo conjecturando (em minhas leituras é sempre assim). 
Por essas e outras, esse é mais um livro interessante para os amapaenses, sobre a Base Aérea em Amapá (esquecida hoje, outrora de grande importância na cooperação entre Brasil e Estados Unidos, para que os aliados saíssem vitoriosos na Segunda Guerra Mundial). 
A publicação é do ano 2000 e tem como autora a professora Cassilda Barreto. 


Título: Pássaros Máquinas no Céu do Amapá
Autora: Cassilda Barreto
Editora: Edição do Autor

Ano: 2000
Páginas: 200
Tema: História do Amapá / Base Aérea / Segunda Guerra Mundial


A obra tem o Prefácio escrito pelo renomado jornalista Hélio Pennafort, onde se vê um entusiasmo em valorização do livro (talvez o único da época sobre o tema). Acompanhe...

"Alvíssaras! Chega a nós os relatos mais precisos e detalhados que se viu até agora de um dos monumentos históricos mais importantes do Estado: A Base Aérea do Amapá. Melhor ainda por que trazidos pela inteligência da professora-escritora-historiadora Cassilda Barreto, produto humano da melhor qualidade, nascido e criado no Município de Amapá.
Só que o livro da Cassilda não fica restrito à base. Vai mais longe. Juntando seus estudos com o material recolhido durante as peregrinações pelos ministérios, conta pedaços importantes da Segunda Guerra Mundial e o que o Amapá teve a ver com ela, incluindo detalhes que bem poderiam ser explorados em salas de aula.
Entre outras coisas, Cassilda expõe pormenores da varredura do litoral amapaense, decorrência da presença de submarinos por aqui. Conta o que foi a Pannair do Brasil e o papel que desempenhou durante a guerra.
Por demais interessante também é o capítulo que relata o fugaz progresso da pequena cidade do Amapá, com a chegada dos americanos.
Enfim, 'Pássaros Máquinas no Céu do Amapá' pode, tranquilamente, ser colocado na estante dos livros indispensáveis para quem deseja conhecer essa valiosa parte de nossa história contada por quem nasceu no cenário dos acontecimentos.
Resgate de fragmentos do passado, tão necessário para que melhor possamos entender o presente e partir para o futuro com mais confiança e com mais certeza de que tudo pode ser melhor."
(Hélio Pennafort - Prefácio).

 Sumário e ilustração da página 41

Registro no Skoob
A maior parte do livro disserta sobre a guerra como um todo e não, especificamente, sobre a Base Aérea em Amapá. O contexto abordado mostra a ascensão do Hitler, o cenário político-econômico mundial e a a inserção do Brasil nesse meio. 
O que me chamou mais atenção foi a abordagem da pressão que o Brasil sofreu para entrar na guerra. Havia, e é mais conhecida, a questão da revolta que a população teve em relação ao torpedeamento alemão contra várias embarcações brasileiras (em nossa costa e em outros continentes), porém, o que não é tão alardeado, foi o plano arquitetado pelos Estados Unidos de invadir o país, que serviu como instrumento político de pressão e colocou-nos sob a influência e dependência político-econômica dos norte-americanos.
A abordagem sobre a base aérea, apesar de limitada, é muito interessante, cheia de curiosidades e de grande importância pelo impacto e influência na região. É outro ponto de destaque no livro. O principal.
Nesse aspecto, a autora fala sobre:
- os zepelins (transitaram por pouco tempo, cerca de um ano, e faziam um patrulhamento da costa similar aos atuais helicópteros, com observações e apoio às embarcações contra submarinos);
- sobre o cotidiano na base (um mundo em paralelo à realidade amazônida, contando com cassino e suas peculiaridades, e um padrão de qualidade que era novidade até em simples coisas, como o sorvete para os moradores da região, além de estimular o comércio local);
- a construção da base (que se deu de forma secreta, estimulando o imaginário popular);
- e da questão estratégica (tráfego aéreo e de aspectos bélicos).
A obra é uma das poucas, talvez a mais importante na região sobre pormenores da Base Aérea em Amapá. Por isso de relevância fundamental para estudos e apreciação.
Percebemos esforços da autora em socializar as pesquisas nessa edição independente, o que é muito louvável, mas teria sido legal também um pouco mais sobre a questão geográfica em ilustrações, ou ainda, impressões populares remanescentes dessa história (não é o foco do livro, mais é um segmento que muito me instiga). Não mereceria um olhar "amazônida" as nave balões em Amapá ou os submarinos alemães na Ilha de Santana? Até hoje sãos lendas fantásticas na visão do caboclo (ou seriam fatos reais - refiro-me ao conteúdo de boca em boca). Ecos de mistérios e imprecisões no imaginário... 
No fim das contas, a obra é um registro valoroso da História do Amapá, para estudos e descobertas.
Já falei? Ah, sim! É mais uma obra que está à disposição na...

Biblioteca Pública Elcy Lacerda
Sala da Literatura do Amapá e da Amazônia 
Macapá - Bairro Central

Sugestão para consultas:

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Cabanagem - Documentos Ingleses (David Cleary)

A história tem cada surpresa inimaginável! Rapaz, e não é mesmo! Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, sabias que houve planos entre os americanos e alemães de invadir o Brasil? E seria pelo Norte e Nordeste. Eu, hein! Se retrocedermos mais, há cerca de 180 anos, vemos uma guerra terrível acontecendo na Amazônia, que foi a Cabanagem, considerada a mais sangrenta em território brasileiro. Agora espia só!  Poderia ter ocorrido também uma invasão de potências mundiais nesse período, tipo França e Inglaterra, com suas esquadras e exércitos dispostos a se meter na confusão e com aval do governante brasileiro para mandar bala em todo mundo, digo, nos pobres cabanos. Deus me livre! Talvez nem pudesse estar matutando agora nessas coisas... Isso veio ao conhecimento popular com a publicação desse livro em 2002, como resultado da pesquisa do historiador David Cleary, em documentação na Inglaterra. Vou te contar mais ou menos um pouco do livro. Repara...

A Cabanagem foi um dos mais trágicos episódios na História do Brasil (o mais sangrento), com uma mortandade de cerca de 20% dos 150 mil habitantes encontrados na Província do Grão-Pará, segundo registros históricos. Alguns autores até elevam esses números, dada a gravidade.
 

A revolta aconteceu no século XIX, entre os anos de 1835 a 1840, por conta da insatisfação da população (em sua maioria eram negros, mestiços e índios) e da elite local (fazendeiros e comerciantes), que se uniram contra o governo regencial pela independência da região. Nos desdobramentos, eles assassinaram o presidente da província e escolheram um representante de seus interesses, que governaria com autonomia.
A maior parte dos revoltosos era de população que vivia em condições precárias (de miséria, fome, violência e de abandono), sendo denominados cabanos por conta de suas rústicas moradias às margens dos rios, as cabanas (sacou donde vem o termo Cabanagem, né!).
 

Os registros mais importantes dessa revolta estão na obra de Domingos Antônio Raiol (o Barão de Guajará), publicada em vários volumes entre 1865 e 1890, intitulada "Motins Políticos" ou "História dos Principais Acontecimentos Políticos da Província do Pará, desde o ano de 1821 até 1835". O barão foi o maior de todos os divulgadores e, às vezes, a única fonte de quase todos os relatos posteriores.

Sabe-se que a história tem episódios que permanecem desconhecidos ou viram especulações e hipóteses contestáveis na falta de registros. Cabanagem - Documentos Ingleses, organizado por David Cleary, desde sua publicação em 2002, é um livro com equiparações de relevância similar ao clássico de Domingos Raiol, por somar fatos desconhecidos nessa revolta, baseando-se na documentação epistolar da Marinha Inglesa (que transitava na região, acompanhava o movimento com interesse e relatava em seus diários de bordo) e nos registros
nas embaixadas e consulados ingleses. O historiador teve a sacada de vasculhar essa produção ao se deparar com o tráfego na leitura de "Motins Políticos" e na ação diplomática. Assim, os documentos foram buscados na década de 1990, sendo repassados ao governo paraense numa importante contribuição histórica.
 
Esta é a origem do livro e o fato mais interessante é a revelação do plano de Diogo Antônio Feijó, governante no período regencial, de reunir um exército com o apoio dos governos de Portugal, Inglaterra e França para recuperar a província. Para isso os respectivos embaixadores foram sigilosamente convocados, como mostra a correspondência inglesa de 17 de dezembro de 1835. As tropas chegariam sem alardes, uniriam forças com o Império e teriam aval para o massacre dos revoltosos na Amazônia. E tudo seria feito na surdina, pois a Constituição do Império proibia terminantemente a admissão de tropas estrangeiras no território do Brasil sem o consentimento da Assembleia Geral. Imagina o escândalo que seria! 


Felizmente, por conta de interesses políticos, o plano não foi adiante.  Olha que essas nações tem histórias terríveis no colonialismo! Poderia ter ocorrido um extermínio maior do que os registros históricos apontam, principalmente quando percebemos um olhar racista em vários documentos ingleses desse livro, que temiam pela população branca e consideravam os mestiços inferiores. Vamos colocar melhor as coisas sem generalizar, esse era o contexto da carta do Ministro Britânico no Rio de Janeiro.
Algumas linhas: "A facção vitoriosa, ou seja, a tropa de selvagens que agora domina o Pará, consiste principalmente de índios (deles existe uma numerosa população entre as Províncias do Pará e Maranhão) e de várias raças mestiças entre índios e negros, classificadas com denominação geral de Cafuzos, estando, creio eu, entre as variedades mais sem valor da espécie humana. Se esses homens conseguirem se manter, não há dúvida de que irão exterminar a raça branca até onde estiver ao seu alcance... Não há, entrementes, nenhuma probabilidade de que os índios ou os negros venham estabelecer qualquer coisa parecida com um governo ou uma forma regular de sociedade... Se a revolução não for dominada agora, a grande e fértil Província do Pará pode ser considerada totalmente perdida para o mundo civilizado." (Trecho da carta datada em 10/11/1835).
Some-se a isso o roubo e morte da tripulação do navio inglês Clio, que foi saqueado pelos cabanos em Salinas. Os documentos apontam uma exigência de reparo e contrapartida ao incidente. Sem contar no interesse e disputa histórica da França na região do Contestado. Será que os ânimos franceses não teriam sido diferentes se o ouro de Calçoene fosse descoberto nesse período e não em 1890? (Essa parte são conjecturas de um leitor que gosta de viajar com a história).
 
Conjecturas tem muitas. A realidade no livro é que as cartas não revelaram interesse nesse plano por parte dos governos convocados. Encontramos linhas de rejeição sobre “a menor possibilidade de o governo de Sua Majestade ou o governo francês anuírem com os desejos do regente, ou consentirem em ordenar uma operação militar, com base em um pedido formulado de maneira tão imprecisa e informal”. Na real, eles consideravam o Feijó incompetente na resolução do movimento (outros aconteciam também no país) e, sem dúvidas, seria uma violação da Constituição.

O livro tem essa importância: 

De revelação de um plano para participação estrangeira na repressão à Cabanagem de forma mais acirrada (os ingleses tem um episódio bélico de bombardeamento de Belém, mas Feijó buscava mais que isso) 
Por mostrar o olhar dos ingleses na região;
E descrever alguns fatos do cotidiano nessa revolta, como o incidente que atingiu o navio mercante inglês. Sobre isso, vemos um relato detalhado na carta de 18/12/1837, pelo Ministro Inglês (ah! esse navio estava com uma carga até as boca de armas - quem com ferro fere...)
 

Por essas e outras, a obra é considerada uma das principais sobre a Cabanagem. São mais de 100 correspondências e a edição é bilíngue. O livro está estruturado com um relato das buscas do autor, seguindo-se as cartas em inglês e português.

Em Macapá, está a disposição para consultas na Biblioteca Ambiental da SEMA. 

Agradeço ao Newton Marcelo a doação que muito enriqueceu nosso acervo.

Título: Cabanagem - Documentos Ingleses
Autor: David Cleary (organizador)
Editora: SECUL/IOE (Secretaria de Cultura e Imprensa Oficial do Estado do Pará)

Ano: 2002
Páginas: 274
Tema: Amazônia / História / Cabanagem

 BIBLIOTECA AMBIENTAL DA SEMA
Macapá - Centro

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Revista ICOMI Notícias Nº 04 (1964)

Devagar vamos conhecendo as históricas edições da ICOMI Notícias. Esse volume foi publicado em abril de 1964 e, entre os destaques, traz reportagens sobre a assistência de saúde na ICOMI (entre as melhores do Brasil na época) e a relação da empresa com a produção agrícola local (havia comércio semanal através de um troley, em 1964).

Imagens retiradas da revista:

O troley comprador chega ao Cupixi, onde se verifica maior volume de compras.
A ação fazia parte de um plano de redução de custos com mercadorias 
e de incentivo ao desenvolvimento local
Equipe médica em visita cotidiana aos doentes recolhidos no hospital.
 Lembro da qualidade do serviço, por exemplo, por ter parentes que se submeteram a cirurgias complicadas no final dos anos setenta, no hospital em Serra do Navio, sendo bem sucedidos diante da gravidade: Apendicite e Histerectomia total
É a sétima edição que disponibilizo no blog. Veja aí: 
Nº 13 (1965) 
Nº 15 (1965)
- Nº 23 (1965) 
- Nº 25 (1966)   
- Nº 34 (1967)