As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

2012 DA14 e o SKYLAB: Uma pequena história em Serra do Navio

Ilustração: blog.cienctec.com.br
No dia 15/02 um inusitado acontecimento ocorrerá nas proximidades da Terra. É que um pequeno asteroide passará perto de nossa órbita - felizmente e pelos estudos da NASA, sem grande risco de colisão.  O viajante cósmico tem nome, 2012 DA14,  foi descoberto ano passado por um grupo de astrônomos amadores da Espanha e desde então vem sendo monitorado pelas agências espaciais. Seu tamanho foi calculado em 46 metros de diâmetro e sua velocidade média é de 13 quilômetros por segundo - o suficiente para, em um hipotético impacto, causar uma destruição equivalente a 2,4 milhões de toneladas de dinamite. A proximidade com que passará é considerada de raspão, pois será menor que a distância da terra para a lua.
Quanta informação! Ah se não fora por isso... Na era da globalização, as notícias percorrem o mundo em pouco tempo e as especulações já não se formam às cegas. 

SKYLAB (Foto: astronomiaamadora.net)
Toda essa situação me fez lembrar de outro acontecimento quando morava em Serra do Navio, no final dos anos setenta. A cidade era considerada a mais organizada no Amapá e me arrisco a dizer de toda a Amazônia, pois tudo ali primava pela qualidade. O que não era privilégio era o acesso às informações como temos hoje, em que qualquer pessoa com um celular conectado pode viajar pelos quatro cantos do mundo. Naquele tempo quem chegava do trem era portador de notícias ou de cartas de parentes e amigos. As informações podiam também ser vistas na banca de revistas do Seu Donaldo, localizada atrás do Manganês Clube, e ainda pelo rádio ou pela televisão, mas com uma peculiaridade própria. Televisão, só no Clube... A exibição começava no final da tarde e a garotada aguardava com expectativa para assistir o famoso Sítio do Pica-Pau-Amarelo. Eu não perdia por nada e aos domingos depois da missa gostava também de assistir Os Trapalhões e o Fantástico, que era o principal programa da televisão brasileira, pois ninguém gostava de perder. Foi nessa rotina que em um domingo vi a notícia sobre a queda de um satélite. Há mais de 30 anos o Fantástico noticiou sobre um tal SKYLAB.
  
Mapa: Google Earth
Meus amigos, as notícias pareciam sempre com um tom trágico e sensacionalista, com mais conjecturas que informações precisas e os telejornais só acirravam isso. Nunca tinha ouvido falar sobre este satélite e o que ficou evidente para todos é que poderia cair repentinamente em qualquer lugar, quem sabe perto de casa ou sobre nossas cabeças. A boataria correu solta na Serra falando-se disso em todo lugar. Na escola, entre os vizinhos e nas rodas de conversa, seja no Manganês ou na lanchonete da Dona Didi, era fato certo a queda e nossa cidade estava na mira do fulano. 
Morava na BC-8 e ainda lembro de alguns vizinhos. Tinha o Carlos, o Lolito (o mesmo que é uma sumidade hoje na música amapaense com seu bandolim), o Ceará Cachorro, o Flecha, o Pedro (que era também pipoqueiro na cidade), o Floriano e o Farripa (nao esqueço da mobilete em que sempre o via passar e, principalmente, de suas belas filhas: amores platônicos). Outros vizinhos eram uns estagiários que sempre se instalavam na casa em frente à minha, o maquinista do trem (não recordo o nome), o Careca, o Fubica e o Jaburu, que moravam nos fundos de casa, na BC-9. O último citado, anos depois se tornou prefeito em Pedra Branca. Ah... meu pai era conhecido pelo simpático apelido de Cara-de-macaco. Eram meus vizinhos, só não tenho certeza se todos estavam na ocasião. Mas a maioria sim.
Se já não bastasse o medo do SKYLAB, terror nos meus pensamentos, em uma bela noite na rua de casa presenciamos um estranho acontecimento.

Eu e meu irmão nos tempos
de meninos na Serra do Navio (1979)
As famílias costumavam se recolher cedo e às nove ou dez horas as ruas estavam desertas, só ficava o pessoal lá do clube em suas competições de sinuca e baralho para voltar a seus lares ou alojamentos. Antes de se recolher a garotada costumava transformar as ruas em reino de brincadeiras. Ficávamos sentados na calçada jogando conversa fora ou inventávamos variadas brincadeiras, com a participação indistinta de meninos e meninas. Era bola, queimada, boca do forno, bole-bole, pula corda, pira-pega, pira-esconde, pira-alta, pira-ajuda, pira-árvore, macaca e sei lá mais o quê. Só não costumava ter nos dias em que havia o clube da leitura, quando a gente ia para a escola emprestar uns livrinhos. Numa destas, por volta das dezenove horas, vimos algo extraordinário. Detrás da montanha surgiram dois grandes círculos no céu. Vieram se movimentando calmamente com uma luminescência amarela, branca e até de um pálido verde, um dentro do outro, e todo mundo saiu de suas casas para ver. Ficamos admirando quando então veio a lembrança do SKYLAB. Um de meus vizinhos, a quem preservo o nome, se ajoelhou e com as mãos estendidas começou a clamar e dizer que o mundo ia acabar. Por um momento deu uma preocupação geral, pois os círculos pareceram crescer. Valha-me Deus! Seria o satélite vindo a nosso encontro? Nosso vizinho foi acalmado pela esposa e o medo foi se dissipando vendo-se a lentidão com que as rodas se moviam, afinal, se fosse algo caindo não ia ser naquela marcha lenta, sei como é isso, nessa época já conhecia a história do mundo dos dinossauros e seu fim. Ninguém se retirou até que sumissem e os círculos se movimentaram na direção de um viveiro de plantas localizado atrás da escola. Com certeza não tinha um corajoso ali para investigar o local naquela hora.

Ilustração baseada nas lembranças daquela noite em Serra do Navio.

No outro dia a conversa rolou solta e ninguém sabia o que foi aquela aparição. Só muito tempos depois que vislumbrei a possibilidade de se relacionarem às explosões que ocorriam na mina, que eram impressionantes e ressoavam em toda a vila. Mesmo assim, não sei ainda de que maneira se formaram aquelas luzes.
Essa foi uma noite inesquecível, onde presenciei por um momento: uma funesta chegada do apocalipse com a queda do SKYLAB, depois um fenômeno inexplicável no universo em que vivia, com aquelas enigmáticas luzes, e, como muitos preferiram acreditar (e é assim até hoje), a passagem de um disco voador sobre Serra do Navio.
Em 11/07/1979 o SKYLAB caiu mesmo, mas no mar, pondo fim aos pesadelos de muita gente. Foi o fim da antiga base espacial americana.
Dia 15/02/2013 um asteróide vai passar do nosso lado. Nada assustador hoje, quando se tem informações mais concretas e facilitadas sobre sua representatividade. Já naquela minha vila, quase 34 anos atrás...