Em "Além dos Marimbus", o cenário é a região já exaurida pelas bateias
dos faiscadores. A causa da miséria não é mais o diamante. É a madeira
que, nos anos 20 e 30, já atraía a cobiça que devastava florestas e
matas.
Inovando o gênero com a técnica e a linguagem de seu primeiro
livro, Herberto surpreende o leitor de hoje com a visão pioneira da
ecologia que, naquele tempo, não entrara ainda no vocabulário e na
preocupação do homem contemporâneo. Até então, a abordagem crítica via nele mais um regionalista, do porte
dos grandes nomes da safra nordestina que emergira na década de 30.
CARLOS HEITOR CONY
CARLOS HEITOR CONY
Título: Além dos Marimbus
Autor: Herberto Sales
Editora: Civilização Brasileira
Páginas: 250
Ano de Publicação: 1961
Romance ambientado em Andaraí, Bahia, na década de 1940, publicado em 1961. A sensação é de retrato da terra, de forma objetiva e informativa, com bastante veracidade ao contexto especialmente por ser a terra natal do autor.
Não são as personagens que se destacam, mas a relação homem-natureza, em dois momentos distintos.
Inicialmente temos uma visão telúrica, destacando-se Manuel João entre as personagens. Canoeiro e mateiro, além de outras ocupações do homem simples integrado à terra, sua companhia proporciona olhar revelador da natureza e região em seu primitivismo, dominada por marimbus (uma região de área pantanosa), matas, pessoas simples e misticismo. Há diálogos sobre lendas, dificuldades enfrentadas e histórias de exploração ao homem (como a de Maria, que fora seduzida e relegada à prostituição). O ponto alto foi o relato do encontro com um 'sucuiuiu' (forma como a temida cobra era conhecida naquelas paragens) na dramaticidade do saber regional.
O outro momento de destaque, e mais significativo do livro, é a percepção do empreendedorismo de sucesso, onde histórias de interesses escusos e até mesmo desleais se projetam na visão do progresso. O contexto revela recursos naturais decaindo em certas atividades, como o garimpo, e as matas passam a despertar interesse madeireiro (deparamos com frases como 'comprar a mata'...). O momento dá destaque ao personagem Jenner e sua visão de sucesso através da instalação de uma serraria. Registre-se que a percepção é de negociatas associadas à exploração devastadora, em conflito de interesses com facetas ordinárias encabeçadas pelo Dr Barreto. Dá sensação de um mundo em transformação onde todos os elementos vistos no primeiro momento parecem insignificantes em prol dos objetivos. Essas coisas não são explícitas em palavras, mas são percebidas no desenrolar.
Não é uma obra de exaltação específica à personagens, prevalecendo a percepção do contexto que se desenvolvia e impactava a região e o homem. O que a obra sugestiona...
A leitura é curiosa em seu contexto na década de 1940, com reflexões válidas ainda para a atualidade. Se teve ou não intenção, existe um pioneirismo ecológico relevante.
Em Macapá, está disponível para leituras na
BIBLIOTECA PÚBLICA ELCY LACERDA