O documentário “O Arpão e o Anzol” foi produzido pelo antropólogo
Carlos Emanuel Sautchuk e integra a tese de doutorado
em Antropologia Social de mesmo título, apresentada à Universidade de
Brasília (UnB) em dezembro de 2007.
O vídeo mostra as pescas do PIRARUCU e da GURIJUBA
na VILA SUCURIJU, comunidade ribeirinha no estuário do rio Amazonas, litoral do Amapá, onde a pesca artesanal é a principal atividade econômica. Vemos as características do local e os processos de captura dos pescadores (marítimos e laguistas) com ênfase às técnicas, experiência, equipamento e ao paralelismo entre a inserção na atividade e a influência no modo de construção da pessoa.
Ficha Técnica:
Roteiro: Carlos Emanuel Sautchuk / Jaime SautchukLocução e Direção: Carlos Emanuel Sautchuk
Imagens: Carlos Emanuel Sautchuk / Geraldo A. Vales / Geaney Santana Gonçalves / Patrícia Pinha
Edição: Marcelo Santos
Duração: 6 minutos
Ano: 2007
Vídeo com legenda em inglês compartilhado do canal Youtube IRIS DAN/Unb
Informações apresentadas:
A comunidade (Imagens retiradas do vídeo)
- A Vila do Sucuriju (Distrito do Município de Amapá) tem 520 habitantes (2007) e fica na região do estuário do Rio Amazonas, no Cabo Norte, litoral do Amapá. Apresenta uma área de 16.700 ha localizada na margem direita do rio Sucuriju, próximo à foz. Limita-se a leste com o oceano Atlântico, e a oeste com a Reserva Biológica do Lago Piratuba. A distancia, em linha reta, é de 120 km de Amapá e 220 km de Macapá. O acesso de barco é difícil e, dependendo das condições climáticas e da maré, pode ser de 18 horas (saindo de Cutias do Araguari), ou de até 20 horas (saindo de Amapá).
Mapa: Sautchuk (2007)
Foto: Patrícia Pinha |
- Ela situa-se na foz do RIO SUCURIJU, que está sob influência das grandes marés da região e é completamente percorrido pela pororoca.
Pororoca no Rio Sucuriju (Foto publicada pelo IEPA) Veja mais imagens dessa pororoca em youtube/JEsivaldoS Não tem a força da que ocorre no Rio Araguari mas é igualmente impressionante |
- A PESCA é a única atividade produtiva e de subsistência. Através do sistema de crédito por aviamento o pescado é revertido na farinha consumida localmente.
- A AGRICULTURA e a PECUÁRIA são limitadas pela inundação das águas marinhas. Também por isso as construções são todas elevadas do solo e ligadas a uma passarela.
Passarelas na Vila de Sucuriju (Foto de FELISBERTO) |
Passarelas na Vila de Sucuriju (Foto de Anderson Batista) |
O fornecimento de energia e obtenção de água potável são problemas que a comunidade enfrenta a anos. Quer conhecer um pouco mais disso? Veja o que foi noticiado no jornalismo local.
Em 2012: Reportagens sobre as dificuldades da comunidade e as expectativas junto aos governantes (Record-AP em Nov/2012 e TV-AP em Nov/2012)
Em 2013: Como estará a comunidade... (Reportagem da TV-AP em Março de 2013)
- Conforme a história local, a vila surgiu no início do século XX quando, a partir de uma promessa feita a N. Srª de Nazaré, uma cobra grande abriu a embocadura do rio antes obstruído. Este acontecimento é celebrado todos os anos na festa da padroeira com missas, bailes e jogos.
- No mito de origem reúnem-se na vila dois tipos de pescadores especializados: os pescadores MARÍTIMOS, que atuam na costa, e os LAGUISTAS, que atuam nos lagos.
Pescador Laguista e Pescadores Marítimos (Imagens retiradas do vídeo)
- O lago é uma região de manguezais e campos alagados onde os laguistas habitam em palafitas e se deslocam em canoas a remo para efetuara a pesca. O pirarucu é o peixe mais buscado e sua captura é efetuada com um arpão (ponta em metal conectada a uma haste em madeira e ligada ao laguista por uma linha).
- A água dos lagos é escura, por isso o pescador atinge o peixe normalmente sem ve-lo. Ele se orienta apenas pelos sinais que seu movimento provoca na superfície, como as ondulações, as borbulhas e o buio (momento em que o pirarucu vem a tona para respirar).
O arpão (Ilustração retirada da tese de Sautchuk - 2007) |
- A captura é uma espécie de jogo com o peixe, considerado esperto e velhaco. O laguista age silenciosamente evitando ser percebido por ele.
- Mas, se o pirarucu parte em fuga, a relação se transforma numa perseguição. Na interação de pessoa a pessoa que estabelece com o peixe, o laguista considera o arpão parte primordial de seu corpo. Quando o arpão se introduz no peixe a canoa é levada e o laguista usa o tato na aproximação do animal.
O laguista (Imagem retirada da tese de Sautchuk - 2007) |
Pirarucu (Quadro de Herivelto) |
- O pescador costeiro se considera um elemento do barco. Sua capacidade se mostra na coordenação com os "camaradas" e objetos a bordo como as cordas, o motor e o próprio convés em movimento. O principal desse objetos é o anzol, pois ele captura o peixe no fundo, mas pode também fisgar o próprio pescador. Para capturar a gurijuba (peixe característico do estuário do Amazonas) centenas de anzois estão conectados a uma linha de cerca de 2 km. Ligado também a ancoras e boias este aparelho é chamado também de ESPINHEL.
- Antes de posicionar o espinhel no fundo tudo é conectado a linha e os anzois são cuidadosamente ordenados. No momento em que a maré assume um fluxo determinado a "linhada" começa. Nessa atividade de coordenação precisa entre a correnteza, o motor e os objetos dos pescadores a tarefa mais importante é a de jogar os anzois ao mar. Mantendo a ordem e tendo em média menos de um segundo para lançar cada anzol o pescador lida com a possibilidade da linha ser tracionada e movimentar os anzois, que podem então fisgá-lo. Para se defender ele porta uma faca na cintura com a qual pode cortar a linha e se desconectar do sistema mecânico que o levaria ao fundo.
Esquema da pescaria com espinhel. Ilustração retirada do trabalho "A Pesca na Ilha do Bailique", de Rúbia Vale (2010) |
"Puxar a linha" é uma tarefa obrigatória e significativa a bordo, implicando em modificações dolorosas ao engrossar as mãos. (Imagem e informação: Sautchuk) |
- Para colher a linha o pescador deve ter as mãos grossas, uma das transformações corporais que o torna capaz de inserir-se plenamente no serviço a bordo. A incerteza sobre a captura da gurijuba não é atribuída ao peixe ou ao pescador, mas às entidades do catolicismo popular local. A principal preocupação para o pescador e o que orienta seu comportamento é a disposição para integrar-se à dinâmica a bordo.
- Além de formas diferentes para captura o uso do arpão e do anzol envolve modos particulares de configuração dos pescadores. São diferentes as capacidades corporais, as relações com o ambiente e as formas de aprendizado e de sociabilidade.
A postagem é uma descrição do vídeo com informações obtidas nas seguintes fontes:
- Tese "O arpão e o anzol : técnica e pessoa no estuário do Amazonas (Vila Sucuriju, Amapá)", de Carlos Emanuel Sautchuk (UNB - 2007)
- Livro "Esse rio abriu da noite pro dia", de Carlos Sautchuk (ACT Brasil - 2006)