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quarta-feira, 16 de agosto de 2017

A Igreja dos Pobres: Resistências Eclesiais no Norte do Brasil, 1966-1983 (Walbi Silva Pimentel)

A Igreja dos Pobres - Resistências Eclesiais no Norte do Brasil (1966-1983) trata sobre o desenvolvimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) no Amapá, num contexto histórico de abertura da igreja aos leigos e aos pobres no período marcado pelo autoritarismo político da ditadura militar, onde as CEBs se tornaram frente de luta por direitos básicos num vasto território de presença precária do Estado.   
O autor, Walbi Silva Pimentel, faz  um apanhado histórico acerca da presença da Igreja Católica no Brasil, do período colonial até o século XX, procurando perceber as relações existentes entre a Instituição e o Estado. Analisando mais aprofundadamente essas relações na Amazônia, buscou-se perceber o caminhar histórico da Igreja que no Amapá, assim como em outras regiões do Brasil, não só modificou os hábitos religiosos das populações locais como também acabou por sofrer modificações devido as interações. (SINOPSE DESCRITA NO LIVRO)
INFORMAÇÕES DO LIVRO
Título: A Igreja dos Pobres: Resistências Eclesiais no Norte do Brasil (1966-1983)
Autor: Walbi Silva Pimentel  
Editora: Prismas  
Páginas: 190  
Ano: 2016
A obra traça um perfil do catolicismo no Amapá a partir do envolvimento com as questões sociais no período da ditadura, onde o contexto da igreja teve transformações progressistas que mudaram sua ação na interação com as comunidades. O autor, Walbi Silva Pimentel, historiador amapaense e militante nas CEBs, dá destaque à esse período de interação transformadora na disposição da igreja, mas iniciou sua pesquisa com a percepção histórica do catolicismo desde o colonialismo.
No primeiro momento de análise, vemos a igreja como instrumento do estado, que a patrocinava estendendo a conquista de fiéis para formação de súditos também, em locais ermos e sob influências contrárias. Essa disposição vinha de muito tempo e como exemplo foram citados doutrinamentos religiosos no contexto medieval, que buscavam o desenlace da influência árabe na Península Ibérica; como não poderia faltar, o autor também citou ordens religiosas apoiadas pela coroa na colonização e catequese do Novo Mundo, destacando-se os jesuítas, carmelitas, mercedários e franciscanos.

Mapa: Presença das ordens religiosas na Amazônia colonial (pág. 81 do livro)
Aspecto em especial nesse contexto foi a interferência direta do estado na hierarquia e caracterização da igreja, que a tornava mais política do que espiritual. Um evento em especial desse embate no Brasil aconteceu no século XVIII, quando os jesuítas foram expulsos em razão do desenvolvimento de propósitos diferenciados dos interesses governamentais, como a oposição à mão de obra indígena e ações com hierarquia própria. Esse momento fragilizou o catolicismo e assim ocorreu adesão e introdução de muitos ritos e tradições do misticismo popular, outrora repelidos, que sem o direcionamento missionário foram incorporados indiscriminadamente.
A aproximação entre a igreja e governo se estreitou no período imperial, quando o catolicismo foi oficializado como religião do país na constituição de 1824, perdurando até a revogação na constituição republicana de 1891, que tornou o país laico. Tem uma colocação do autor que não concordo, de que existia uma coexistência pacífica com outros credos, citando-se o texto integral da constituição (Art. 5) de que eram permitidos no contexto domiciliar. Existe muita diferença entre teoria e prática. Sei muito bem que o período entre as constituições criou uma mentalidade de visão subversiva à outras manifestações religiosas, que se estendeu ainda em muitas décadas no século XX estimulando sérios embates religiosos, como o que ocorreu em Macapá com a chegada dos evangélicos em 1916 - seja pela tradição familiar ou incentivo de padres baseando-se nessa mentalidade ultrapassada.
A aproximação com o estado, chamado de padroado régio, custou  foi a jurisdição prática na igreja, que era diretamente influenciada pelo governo, deixando-a à mercê de politicagem e mistura com paganismo, citando-se a introdução de membros da maçonaria.
No início do século XX há referência à ação católica com um dinamismo que na prática a colocava desempenhando papel governamental em locais altamente carentes, por sua mobilização contemplando a saúde, a educação e a valorização das comunidades. O autor cita aproximação governamental, mas a igreja tinha outra caracterização, que se reformulou pelas determinações progressistas do Concílio do Vaticano II e, mais adiante, por missionários influenciados pela Teologia da Libertação (onde o evangelho era direcionado à libertação do homem da injustiça social, com desenvolvimento de ações nesse sentido) ou por movimentos de combate à opressão e injustiça. Esse é o contexto privilegiado no livro, ocorrido em paralelo ao governo da ditadura militar, onde as mazelas sociais instigaram o catolicismo ao desempenho de lutas principalmente no contexto social, resultando em movimentos sindicais, associação de moradores, cursos profissionalizantes e maior participação política em prol dessas questões.


Walbi Silva Pimentel - Especialista em História e Historiografia da Amazônia pela Universidade Federal do Amapá e graduado em História pela mesma instituição. Há três anos trabalha na rede estadual de ensino no Amapá, ministrando aulas de História às séries do Ensino Médio.
Desde sua juventude é militante das Comunidades Eclesiais de base (CEBs), Pastoral da Juventude e Pastoral Carcerária, de onde tirou sua inspiração para este livro (BIOGRAFIA NO LIVRO)


Outro momento mostra a Amazônia e o Amapá nesse contexto, destacando o padre Júlio Maria Lombard, nos anos de 1913 à 1923 (quando trabalhou em Macapá) e a chegada dos missionários estrangeiros do PIME a partir de 1948.
Sobre o padre vemos aquela questão do catolicismo voltado às carências sociais, em seu importante trabalho na educação, saúde e cultura numa região sem infraestrutura. Além dessas ações, a igreja que age no papel governamental por sua representatividade prática é exemplificada também no autoritarismo que o mesmo padre desenvolveu, como se fosse a autoridade maior, em embates com o movimento do Marabaixo (quase causando um tiroteio no domicílio da igreja) e contra o primeiro evangélico na cidade, a quem mandou prender arbitrariamente, destruindo o material que trazia (Bíblias e literatura evangelística) e semeando mentalidade perseguidora. Fato ocorrido em 1916 (que o autor em um pequeno lapso referenciou em 1913).
A chegada dos missionários do PIME (Pontifício Instituto das Missões Exteriores), outro momento de destaque no livro na percepção da ação católica, mostra padres que eram mais envolvidos com questões sociais e movimentos de esquerda, vindo também em resposta à carência de sacerdotes católicos. O autor cita a chegada de 53 entre os anos de 1948 à 1972 (exemplificando, Simão Corridori, Ângelo Negri, Pedro Locati e Antonio Cocco); que houve aceitação grande, abertura de igrejas na capital e interior, e que o PIME, não encontrando campos tão favoráveis em outros locais, teria solicitado a vinda à nosso país, onde se ajustou bem na carência que existia no catolicismo, desenvolvendo trabalhos em três cidades onde se instalaram: São Paulo, Manaus e Macapá.

Entre as comunidades e paróquias fundadas pelo PIME:
- Nossa Senhora do Perpétuo Socorro (Santana, 1954)
- Nossa Senhora da Conceição (Macapá, 1959)
- Nossa Senhora das Graças (Oiapoque, 1959)
- Nossa Senhora de Fátima (Macapá, 1964)
- Nossa Senhora dos Navegantes (Região das Ilhas, 1974)
- Sagrado Coração de Jesus (Macapá, 1978) 
- Cristo Libertador (Pacuí, 1982)
Bairro do Buritizal em 1976 (Acervo pessoal do Pe. Luís Carlini - Pág. 127 do livro)
Ilustração dos cenários de desenvolvimento das CEBs
O capítulo final é dedicado à ação comunitária, envolvida com mutirões, assistencialismo, sindicatos, associação de moradores e envolvimento político, que aproximou o catolicismo principalmente das populações mais carentes. Razão do título do livro e do enfoque em especial no período da ditadura. Segundo o texto, havia o anseio, a cobrança e a expectativa da ação católica nesse sentido. Fatos que reorganizaram a igreja em seu direcionamento.
Foi o que entendi em uma interessante leitura.

(REGISTRO NO SKOOB, em 12/08/2017)


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