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segunda-feira, 21 de agosto de 2017

A ocupação desordenada da Amazônia e seus efeitos econômicos, sociais e ecológicos (Juraci Perez Magalhães)

Interessante que o desenvolvimento sustentável, apesar de não ser um termo que apareça literalmente nessa obra, está implícito e é o direcionamento no entendimento à fatores que desencadearam uma desordem na Amazônia (pelo descaso) e, principalmente, se reflete nas projeções e políticas que se adequam ao cenário ambiental (ou deveriam).
A obra é de 1990, onde o termo era novo, se consolidando na ECO-92, mas a percepção sobre ele vinha de lutas sindicais dos seringueiros que propunham a formação de reservas extrativistas em uma dinâmica inovadora para o desenvolvimento na Amazônia.
Esse cenário agitava o contexto da publicação, principalmente pela recente morte do Chico Mendes, e a proposta que o autor apresentou foi um estudo sobre a ocupação da Amazônia, percebendo os desajustes que levaram à desordem no progresso e entendendo as medidas necessárias para as transformações buscadas.
INFORMAÇÕES DO LIVRO
Título: A ocupação desordenada da Amazônia e seus efeitos econômicos, sociais e ecológicos
Autor: Juraci Perez Magalhães
Editora: Gráfica e Editora Completa Ltda 
Páginas: 112 
Ano: 1990
O primeiro momento vê a ocupação da Amazônia em diferentes fases históricas, tendo em comum fracassos, citando-se a política ocupacional incentivada pelo Marquês de Pombal no século XVIII, o projeto da Fordlândia no Pará para extração do látex, a sedução à migrantes nordestinos como soldados da borracha, as políticas de incentivos fiscais para atrair empreendimentos industriais e desenvolvimento de pecuária no governo militar, e o maior exemplo de fracasso empresarial na Amazônia (o Projeto Jari idealizado por Ludwig). Todos esses momentos atraíram muitas pessoas e o insucesso nessa ocupação, na caracterização de desordem, foi determinado pela ausência de técnicas adequadas para a realidade ambiental. 
Os capítulos II, III e IV exemplificam essa questão, cheia de falhas e desacertos, focando especificamente o desenvolvimento incentivado no governo militar. Coisas que, relativamente, foram vistas em outros momentos também. Havia grandes extensões de terras desocupadas e em cima disso foram criadas políticas e instituições para atrair e apoiar empreendimentos. Foi o caso da SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) e do I PND (Plano Nacional de Desenvolvimento). Este último é tratado como um dos maiores incentivadores de fracassos (e não à toa). A política era extremamente ufanista e ousada, se prestando à resolver a situação do nordestino afligido pela seca, colocando-o em uma região rica em recursos. Slogans como esse eram comuns. No suporte, a idealização de rodovias que integrariam a Amazônia (como a Transamazônica, a Belém-Brasília e a Perimetral Norte), o incentivo para o estabelecimento da pecuária e os financiamentos facilitados para a entrada de empreendimentos.
Muito entusiasmo e pouco investimento na prospecção da região para identificar manejo adequado, que redundaram em fracassos, comprovando-se em pouca fertilidade do solo, várias pragas agrícolas, degradação ambiental através do desmatamento, impactos sobre a fauna e flora, choque com os povos nativos, descaso com a vocação potencial da região, vinda de aventureiros que aproveitaram os incentivos fiscais para enriquecimento, formação de grandes latifúndios, poluição, violência no campo, insucesso em culturas introduzidas, desenvolvimento de pecuária por sulistas em regiões com história extrativista onde os fazendeiros descartaram o manejo e combateram as comunidades assentadas nessa cultura, alteração de ciclos hidrológicos, efeitos sobre o clima e microclima, danos ao solo, desertificação, entre outros aspectos.
 
O capítulo V explana sobre a região em diferentes contrastes, representados pelo homem, pelos recursos naturais e pela necessidade de preservação, com desdobramentos meio. Mostram-se efeitos nocivos das ações do PND sem um adequado planejamento. Também são norteados fatores necessários para a ocupação organizada e progresso, que deveriam preservar recursos naturais renováveis, fixar o homem no campo evitando o desemprego, respeitar a vocação regional e evitar o desmatamento. 
A problemática de vários povos, principalmente os indígenas, é levantada em considerações impactantes.
Esses aspectos de visão sobre o homem e sobre a natureza em suas peculiaridades foram ressaltados para direcionamento no desenvolvimento e ocupação.
 
A obra finaliza com mitos sobre a Amazônia, refutados individualmente nos seguintes pontos: sobre a Amazônia ser o pulmão do mundo, ter solo fértil em face de sua opulência, ser intocável ou a ocupação estar ocorrendo racionalmente.
Muito interessante, apontando caminhos para a sustentabilidade que respeitem os elementos naturais e o homem nesse meio.
Vou deixar em registro final uma citação da obra, extraída dos estudos de Euclides da Cunha, logo no começo do livro, de que o homem na Amazônia é como um intruso impertinente. Em termos práticos significa dizer que ele viu a floresta como uma desordem e procurou organizá-la a seu modo. Foi o que fez políticas arcaicas como os primeiros PNDs e ainda tem acontecido nos dias atuais.
 
O livro faz um passeio por essas coisas, chamando atenção com uma caracterização pioneira em sua época pelas discussões provocadas. A única coisa que não curti foi a metodologia conservadora, da época de publicação, sem um mínimo de ilustração além das capas.

Disponível para consultas 
na Biblioteca Ambiental da SEMA 
em Macapá