"A história dos primeiros anos de Amapá Território ainda não foi contada ou escrita completamente. Obviamente não poderia fazê-lo a contento, porque não sou historiador. Todavia, propus-me a citar os fatos vividos por mim nestes longos anos de vida no Território (maio de 1943 a 2012). A maioria são impressões que mais ficaram na memória; os demais, alguns problemas ligados às imensas riquezas do Amapá, ainda não explorados devidamente e, além disso, um esclarecimento sobre a verdade do contrato do manganês. Procuro alinhar algumas das muitas riquezas que o Amapá possui e que o público sabe que existem, mas não tem consciência de seu valor intrínseco. O cidadão comum precisa inteirar-se das suas potencialidades, para que se possa pressionar os seus representantes a lutar por medidas necessárias à exploração racional desse patrimônio que, a meu ver, continua esquecido ou ignorado." ELFREDO TÁVORA GONSALVES
Informações gerais:
Título: O Amapá d'Outrora
Autor: Elfredo Távora Gonsalves
Editora: Tarso
Ano: 2015
Páginas: 176
Tema: Memórias, História do Amapá, ICOMI
Registro no Skoob:
Excepcional livro de Elfredo Távora, jornalista e pioneiro no
Território Federal do Amapá, publicado em 2015, ano de seu falecimento.
Um relato de amor a terra, valorizando a história (interessante em sua
percepção como pioneiro), riquezas e, principalmente, reflexões em
conceitos que se estabeleceram sobre o desenvolvimento amapaense.
O primeiro momento é de ênfase às riquezas, se estendendo em diferentes recursos naturais. Potencialidades correlacionadas à ocupação e exploração da terra, em história revisitada desde os tempos coloniais.
A descrição é didática e prática, abordando a importância científica e o contexto de exploração no Amapá.
O autor tem visão muito interessante. Bauxita, cassiterita, ouro, ferro, caulim (você sabe onde é explorado e quem lucra com isso?), produtos madeireiros, entre outros aspectos, são apresentados com direcionamento ao Amapá. Dessa forma, a leitura gera conclusões que desmistificam muitos conceitos (como a visão recorrente sobre a ICOMI), reveladoras também sobre figuras históricas (como Janary Nunes e sua disposição facilitadora à ações contratuais que acabaram sendo prejudiciais ao Amapá).
O paralelo entre o desenvolvimento do Amapá e ação da ICOMI é o aspecto mais interessante do livro. Elfredo Távora chama atenção para importante discussão, onde quem ganha é o povo amapaense, desmistificando visão de que a empresa foi extremamente benevolente e responsável pelo desenvolvimento do estado.
Existe a visão emotiva, nostálgica de quem fez parte, vivenciou e assim de alguma maneira foi beneficiado pelo empreendimento (rotineiramente prestigio algo nesse sentido). Mas tem também a visão de análise da representatividade da empresa para o estado, para o povo amapaense, analisando-se de forma prática essa relação. É a esse segundo aspecto que Elfredo chama a atenção no livro.
Além da percepção como pioneiro desde 1943, ter trabalhado no Território, desenvolvido história jornalística, vivenciando ou conhecendo muitas personagens e fatos, o autor privilegiou também duas fontes de consultas: Quem explorou quem no contrato de manganês (Álvaro da Cunha, 1962) e O Amapá nos tempos do manganês (Drummond e Mariângela, 2007).
Em linhas gerais, o autor reacende a discussão fomentada por Álvaro da Cunha já nos primórdios da ICOMI no Amapá, sobre o acordo que beneficiava mais a empresa do que o Território. Entre outras coisas, esse contrato foi feito em sigilo e pressa, com ditames que na prática geraram isenção de muitos impostos, permitiram ação fechada da empresa sem intervenções governamentais, onde se beneficiou do governo para seus interesses, não apresentando relatórios de balanços financeiros. O autor chama as vilas de guetos sociais, onde a realidade fora desse contexto gerou bolsões de pobreza na periferia, devido a idealização de um Eldorado. A estrutura das vilas, super destacadas da realidade amapaense, foram sobretudo uma iniciativa privada para atender os interesses de produtividade, não uma benevolência. Na prática, além de gueto social, como se referiu o autor, também pareciam sociedade distópica por conta do monitoramento e controle acirrados em vários sentidos.
Essas considerações, não enfatizadas no livro de Drummond e Mariângela, são as principais questões do autor em contraposição. O desenvolvimento amapaense está relacionado à suas potencialidades, onde a ICOMI teve facilitações para explorar, gerando muita injustiça no que se estabeleceu comercialmente para o Amapá e, no imaginário, se tornou uma empresa benevolente que teria sido responsável pelo desenvolvimento. Elfredo enfatiza esses aspectos, que não podem se ausentar ou dissociar no estudo sobre a ICOMI.
As questões são trabalhadas com muita propriedade e a leitura é imprescindível para estudiosos da história amapaense.
No final, tece algumas considerações sobre a Amazônia, destacando outras manobras externas que também espoliaram riquezas (como o roubo das sementes da seringueira no século XIX por inglês, que acabou com o áureo ciclo da borracha).
O único aspecto que não achei interessante, foi a breve consideração sobre o coronelismo. Espoliaram e usufruíram da terra também, com ditames arbitrários em interesses individualistas, como José Júlio de Andrade na Jari.
O primeiro momento é de ênfase às riquezas, se estendendo em diferentes recursos naturais. Potencialidades correlacionadas à ocupação e exploração da terra, em história revisitada desde os tempos coloniais.
A descrição é didática e prática, abordando a importância científica e o contexto de exploração no Amapá.
O autor tem visão muito interessante. Bauxita, cassiterita, ouro, ferro, caulim (você sabe onde é explorado e quem lucra com isso?), produtos madeireiros, entre outros aspectos, são apresentados com direcionamento ao Amapá. Dessa forma, a leitura gera conclusões que desmistificam muitos conceitos (como a visão recorrente sobre a ICOMI), reveladoras também sobre figuras históricas (como Janary Nunes e sua disposição facilitadora à ações contratuais que acabaram sendo prejudiciais ao Amapá).
O paralelo entre o desenvolvimento do Amapá e ação da ICOMI é o aspecto mais interessante do livro. Elfredo Távora chama atenção para importante discussão, onde quem ganha é o povo amapaense, desmistificando visão de que a empresa foi extremamente benevolente e responsável pelo desenvolvimento do estado.
Existe a visão emotiva, nostálgica de quem fez parte, vivenciou e assim de alguma maneira foi beneficiado pelo empreendimento (rotineiramente prestigio algo nesse sentido). Mas tem também a visão de análise da representatividade da empresa para o estado, para o povo amapaense, analisando-se de forma prática essa relação. É a esse segundo aspecto que Elfredo chama a atenção no livro.
Além da percepção como pioneiro desde 1943, ter trabalhado no Território, desenvolvido história jornalística, vivenciando ou conhecendo muitas personagens e fatos, o autor privilegiou também duas fontes de consultas: Quem explorou quem no contrato de manganês (Álvaro da Cunha, 1962) e O Amapá nos tempos do manganês (Drummond e Mariângela, 2007).
Em linhas gerais, o autor reacende a discussão fomentada por Álvaro da Cunha já nos primórdios da ICOMI no Amapá, sobre o acordo que beneficiava mais a empresa do que o Território. Entre outras coisas, esse contrato foi feito em sigilo e pressa, com ditames que na prática geraram isenção de muitos impostos, permitiram ação fechada da empresa sem intervenções governamentais, onde se beneficiou do governo para seus interesses, não apresentando relatórios de balanços financeiros. O autor chama as vilas de guetos sociais, onde a realidade fora desse contexto gerou bolsões de pobreza na periferia, devido a idealização de um Eldorado. A estrutura das vilas, super destacadas da realidade amapaense, foram sobretudo uma iniciativa privada para atender os interesses de produtividade, não uma benevolência. Na prática, além de gueto social, como se referiu o autor, também pareciam sociedade distópica por conta do monitoramento e controle acirrados em vários sentidos.
Essas considerações, não enfatizadas no livro de Drummond e Mariângela, são as principais questões do autor em contraposição. O desenvolvimento amapaense está relacionado à suas potencialidades, onde a ICOMI teve facilitações para explorar, gerando muita injustiça no que se estabeleceu comercialmente para o Amapá e, no imaginário, se tornou uma empresa benevolente que teria sido responsável pelo desenvolvimento. Elfredo enfatiza esses aspectos, que não podem se ausentar ou dissociar no estudo sobre a ICOMI.
As questões são trabalhadas com muita propriedade e a leitura é imprescindível para estudiosos da história amapaense.
No final, tece algumas considerações sobre a Amazônia, destacando outras manobras externas que também espoliaram riquezas (como o roubo das sementes da seringueira no século XIX por inglês, que acabou com o áureo ciclo da borracha).
O único aspecto que não achei interessante, foi a breve consideração sobre o coronelismo. Espoliaram e usufruíram da terra também, com ditames arbitrários em interesses individualistas, como José Júlio de Andrade na Jari.
Leitura envolvente e instigante.
Em Macapá, o livro pode ser consultado na Biblioteca Pública Elcy Lacerda (Sala da Literatura Amapaense) e Biblioteca SEMA-AP.