As postagens desse blog são em caráter informal, de apego ao saber popular, com seu entusiasmo, exageros, ingenuidade, acertos e erros.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

XODÓ: Esquina da saudade com a boêmia


Faço aqui o resgate de textos, pois sei de sua importância na história dessa cidade ou Estado. Limito-me a publicar os textos na íntegra, com os devidos créditos, na certeza de estar propagando algo já esquecido, destinado ao esquecimento ou pouco visto na atualidade.

O texto a seguir trata do Bar Xodó, um bar tradicional em Macapá que começou a funcionar no início dos anos 70. Foi publicado no Jornal do Dia, de 27 e 28 de fevereiro de 1994.

XODÓ: A esquina da saudade com a boemia
 Texto de Cláudio Mendes


Macapá mudou muito nos últimos 23 anos. O tempo passou rápido e até mesmo despercebido, transportando gerações após gerações. No entanto o velho Bar Xodó continua ali (Jornal de 1994), bem na esquina da rua General  Rondon com a avenida Iracema carvão Nunes, no centro da cidade, sempre de cara nova e parecendo observar tudo o que acontece ao seu redor.  Se pudesse falar, com certeza, relataria fatos bem interessantes que certos pais ainda não contaram aos filhos.

Muitos de seus atuais freqüentadores nem sequer desconfiam, mas aquele tão bem equipado bar já foi um humilde boteco, porém, sempre de primeira categoria. Funcionou primeiramente no Santa Rita, no tempo em que o bairro era considerado o mais movimentado da cidade se tratando de vida noturna. Na esquina onde está localizada atualmente a Madeireira Amazônia, o Xodó ficou durante um ano, quando mudou-se para o local onde mantem até os dias atuais.

TEMPO DE CAVALO E BOIS

No início da década de 70, época em que ainda se podia ver cavalos e bois caminhando pelo centro da cidade, o comerciante Albino Marçal resolveu alugar o ponto comercial pertencente ao prédio Arnô. Parecia ser o início de um grande negócio. O Colégio Amapaense já havia sido construído e lá “estudavam” alguns jovens boêmios que adoravam matar aula para curtir uma boa farra. Definitivamente, aquele era o local ideal para a nova instalação do bar.

Para conquistar rápida freguesia, Albino não deu moleza. Uma vela aqui, um incenso ali, uma boa oração à São Benedito e em pouco tempo o pequeno empreendimento se tornou um dos mais freqüentados da cidade. Deixou de ser chamado de bar da Esquina, popularizando-se com seu verdadeiro nome: Bar Xodó. Por ele passaram muitas gerações de jovens que muito andaram aprontando.

Começou a funcionar no início dos anos 70.
Albino conta que nos primeiros anos de funcionamento do bar havia uma turminha que sempre dava o que falar. A tão agitada turma era formada por jovens estudantes como Roberto Rodrigues, Roberval Picanço, Maurício Mescouto, Luíz Eduardo (o popular Run), Paulão do Atabaque; Eitor Picanço Júnior e outros. Certo dia a turma se reuniu no bar, comprou uma garrafa de bebida e resolveu tomá-la em cima da caixa d’água, localizada em frente ao IETA. A polícia chegou e fez todos descerem, mas no momento em que a turma descia, alguém exclamava: “falta o Run, falta o Run”. Um dos policiais não sabendo do que se tratava retrucou: “Vocês já tomaram todas e ainda querem Run?”. Nessa ocasião o Run, que não era bebida, mostrava a carinha de fininho.

Mas os tempos mudaram e os integrantes da antiga turminha da pesada se tornaram pessoas bem sucedidas. Infelizmente, Eitor Picanço (Eitorzinho) e Paulão do atabaque já são falecidos.

Albino também conta que em outra noite, o soldado que encontrava-se de plantão no Palácio do Governo, chegou apavorado no bar porque teria visto um bicho pela redondeza. Todos que estavam presentes, inclusive alguns membros da “turma da pesada”, se armaram de pau e pedra para enfrentar o tal bicho. Foi o maior corre-corre até todos perceberem que tratava-se de um tamanduá-bandeira que acabou parando na panela de um deles.

É isso aí. Até tamanduá-bandeira passeava pelo centro de Macapá no início da década de 70, quando o bar Xodó começou a funcionar. Aquele era o tempo em que calça boca de sino e blusa de lastex faziam sucesso. O esmalte Cutéx era o favorito das meninas e a brilhantina ainda era muito usada pelos rapazes.

OUTRA GERAÇÃO

Quando chegaram os anos 80, o Xodó já havia se tornado tradição. O Colégio Amapaense havia recebido mais um pavimento, que agora atendia a um maior número de estudantes e, consequentemente, o bar ganhava mais freqüentadores dia e noite. O Xodó conheceu muitas mulheres bonitas e sempre soube atendê-las muito bem. Albino Marçal disse que Sandra Ohana Nery, considerada uma das mais belas misses que o Amapá já teve, também foi sua freguesa e quando por lá passava, não conseguia evitar os galanteios. “Era carro buzinando pra todo lado”, relembra o dono do bar.

A amizade da jornalistas Márcia Corrêa e Hanne Capiberibe existe há muitos anos. As duas cresceram juntas e quando estudantes do Colégio Amapaense, sempre davam uma escapadinha para papear no Xodó. Tanto Márcia como Hanne sempre tiveram idéias revolucionárias e agitavam o movimento estudantil da época. “Era um tempo de inesquecíveis amizades. No bar Xodó acontecia de tudo”, relembra Márcia.

Foram tantos os fatos que aconteceram envolvendo o Xodó, que hoje o bar é tido por muitos como um verdadeiro patrimônio da cidade. Se algum dia deixar de existir, com certeza deixará também muitas saudades.

Em 1995 o Xodó fez bodas de prata, contando com o ano que funcionou no Santa Rita.

O lugar hoje é ocupado por uma loja.
Jornal do Dia (27 e 28 de fevereiro de 1994).