Faço aqui o resgate de textos, pois sei de sua
importância na história dessa cidade ou Estado. Limito-me a publicar os textos
na íntegra, com os devidos créditos, na certeza de estar propagando algo já
esquecido, destinado ao esquecimento ou pouco visto na atualidade.
O texto a seguir trata do Bar Xodó, um bar
tradicional em Macapá que começou a funcionar no início dos anos 70. Foi
publicado no Jornal do Dia, de 27 e 28 de fevereiro de 1994.
XODÓ: A esquina da saudade com a boemia
Texto de Cláudio Mendes
Macapá mudou muito nos últimos 23 anos. O tempo
passou rápido e até mesmo despercebido, transportando gerações após gerações.
No entanto o velho Bar Xodó continua ali (Jornal de 1994), bem na esquina da
rua General Rondon com a avenida Iracema
carvão Nunes, no centro da cidade, sempre de cara nova e parecendo observar
tudo o que acontece ao seu redor. Se
pudesse falar, com certeza, relataria fatos bem interessantes que certos pais
ainda não contaram aos filhos.
Muitos de seus atuais freqüentadores nem sequer
desconfiam, mas aquele tão bem equipado bar já foi um humilde boteco, porém,
sempre de primeira categoria. Funcionou primeiramente no Santa Rita, no tempo
em que o bairro era considerado o mais movimentado da cidade se tratando de
vida noturna. Na esquina onde está localizada atualmente a Madeireira Amazônia,
o Xodó ficou durante um ano, quando mudou-se para o local onde mantem até os
dias atuais.
TEMPO DE CAVALO E BOIS
No início da década de 70, época em que ainda se
podia ver cavalos e bois caminhando pelo centro da cidade, o comerciante Albino
Marçal resolveu alugar o ponto comercial pertencente ao prédio Arnô. Parecia
ser o início de um grande negócio. O Colégio Amapaense já havia sido construído
e lá “estudavam” alguns jovens boêmios que adoravam matar aula para curtir uma
boa farra. Definitivamente, aquele era o local ideal para a nova instalação do
bar.
Para conquistar rápida freguesia, Albino não deu
moleza. Uma vela aqui, um incenso ali, uma boa oração à São Benedito e em pouco
tempo o pequeno empreendimento se tornou um dos mais freqüentados da cidade.
Deixou de ser chamado de bar da Esquina, popularizando-se com seu verdadeiro
nome: Bar Xodó. Por ele passaram muitas gerações de jovens que muito andaram
aprontando.
Começou a funcionar no início dos anos 70. |
Albino conta que nos primeiros anos de
funcionamento do bar havia uma turminha que sempre dava o que falar. A tão
agitada turma era formada por jovens estudantes como Roberto Rodrigues,
Roberval Picanço, Maurício Mescouto, Luíz Eduardo (o popular Run), Paulão do
Atabaque; Eitor Picanço Júnior e outros. Certo dia a turma se reuniu no bar,
comprou uma garrafa de bebida e resolveu tomá-la em cima da caixa d’água,
localizada em frente ao IETA. A polícia chegou e fez todos descerem, mas no
momento em que a turma descia, alguém exclamava: “falta o Run, falta o Run”. Um
dos policiais não sabendo do que se tratava retrucou: “Vocês já tomaram todas e
ainda querem Run?”. Nessa ocasião o Run, que não era bebida, mostrava a carinha
de fininho.
Mas os tempos mudaram e os integrantes da antiga
turminha da pesada se tornaram pessoas bem sucedidas. Infelizmente, Eitor
Picanço (Eitorzinho) e Paulão do atabaque já são falecidos.
Albino também conta que em outra noite, o soldado
que encontrava-se de plantão no Palácio do Governo, chegou apavorado no bar
porque teria visto um bicho pela redondeza. Todos que estavam presentes,
inclusive alguns membros da “turma da pesada”, se armaram de pau e pedra para
enfrentar o tal bicho. Foi o maior corre-corre até todos perceberem que tratava-se
de um tamanduá-bandeira que acabou parando na panela de um deles.
É isso aí. Até tamanduá-bandeira passeava pelo
centro de Macapá no início da década de 70, quando o bar Xodó começou a
funcionar. Aquele era o tempo em que calça boca de sino e blusa de lastex
faziam sucesso. O esmalte Cutéx era o favorito das meninas e a brilhantina
ainda era muito usada pelos rapazes.
OUTRA GERAÇÃO
Quando chegaram os anos 80, o Xodó já havia se
tornado tradição. O Colégio Amapaense havia recebido mais um pavimento, que
agora atendia a um maior número de estudantes e, consequentemente, o bar
ganhava mais freqüentadores dia e noite. O Xodó conheceu muitas mulheres
bonitas e sempre soube atendê-las muito bem. Albino Marçal disse que Sandra
Ohana Nery, considerada uma das mais belas misses que o Amapá já teve, também
foi sua freguesa e quando por lá passava, não conseguia evitar os galanteios.
“Era carro buzinando pra todo lado”, relembra o dono do bar.
A amizade da jornalistas Márcia Corrêa e Hanne
Capiberibe existe há muitos anos. As duas cresceram juntas e quando estudantes
do Colégio Amapaense, sempre davam uma escapadinha para papear no Xodó. Tanto
Márcia como Hanne sempre tiveram idéias revolucionárias e agitavam o movimento
estudantil da época. “Era um tempo de inesquecíveis amizades. No bar Xodó
acontecia de tudo”, relembra Márcia.
Foram tantos os fatos que aconteceram envolvendo o
Xodó, que hoje o bar é tido por muitos como um verdadeiro patrimônio da cidade.
Se algum dia deixar de existir, com certeza deixará também muitas saudades.
Em 1995 o Xodó fez bodas de prata, contando com o
ano que funcionou no Santa Rita.
O lugar hoje é ocupado por uma loja. |
Jornal do Dia (27 e 28 de fevereiro de 1994). |